Depois do bacana Fale Comigo(2023), os irmãos Phillipou
vem para seu segundo longa-metragem explorando o luto e os extremos nos quais
as pessoas vão para sanar sua dor. Faça
Ela Voltar tenta construir seu terror ao redor dessa dor.
Deixe ela entrar
Os irmãos Andy (Billy Barratt) e
Piper (Sora Wong) ficam órfãos depois da morte do pai. Como os dois são menores
de idade, são colocados em lares adotivos. Inicialmente, por Andy estar perto
de completar dezoito anos, ele deveria ser mandado para um local diferente de
Piper, mas consegue convencer a assistente social a mantê-los juntos por conta
de Piper ser cega. Os dois vão morar com Laura (Sally Hawkins), uma mulher
solitária que perdeu a filha, cega como Piper, anos atrás. Laura também cuida
do garoto Oliver (Jonah Wren Phillips), que não fala e exibe um comportamento
estranho, estando sempre com fome. Desde o início é visível que Laura se
importa mais com Piper e deixa Andy de lado, mas conforme os irmãos passam mais
tempo com sua nova tutora vai ficando evidente que ela tem planos sinistros
para eles, principalmente pelo modo que ela atormenta Andy.
Estrelada por Vanessa Kirby, a
produção da Netflix A Noite Sempre Chega
tenta funcionar simultaneamente como thriller,
além como um drama social e um estudo de personagem. O filme nem sempre
consegue equilibrar suas várias ideias, no entanto, alguns elementos bem
executados fazem a experiência valer à pena.
Noite afora
A trama é centrada em Lynette
(Vanessa Kirby), que vive junto com a mãe, Doreen (Jennifer Jason Leigh), e o
irmão mais velho, Kenny (Zack Gottsagen), que tem Síndrome de Down. Lynette se
equilibra entre vários empregos e outros serviços para tentar equilibrar as contas.
Ela e a mãe estão prestes a conseguir um empréstimo para comprarem a casa onde
moram ou perderão o imóvel. No dia de assinarem o financiamento, no entanto, Doreen
não aparece e Lynette descobre que a mãe comprou um carro com o dinheiro que
tinham guardado para a entrada da casa. Sem poder dar a entrada e iniciar a compra,
Lynette tem até a manhã seguinte para levantar o valor ou perderá a chance de
comprar o imóvel, iniciando uma corrida desesperada através da noite.
Depois do pavoroso Jurassic World: Domínio (2022), a
franquia parecia não ter mais onde ir com aqueles personagens. Talvez por isso
que resolveram fazer esse Jurassic World:
Recomeço como uma espécie de soft
reboot, mantendo o universo e a cronologia, mas trazendo novos personagens.
Podia ser um meio de trazer frescor a essa desgastada série de filmes, ainda
mais com Gareth Edwards, responsável por Rogue One: Uma História Star Wars(2016). Infelizmente não é o que acontece e a
produção não consegue afastar o gosto de janta velha requentada.
Narrativa jurássica
A trama é focada na mercenária
Zora (Scarlett Johansson), contratada pelo executivo de uma empresa
farmacêutica, Martin Krebs (Rupert Friend), para liderar uma missão a
territórios próximos da linha do Equador que agora são habitados por
dinossauros. O objetivo é recuperar amostras de sangue de três grandes
dinossauros ainda vivos para que elas sejam usadas em pesquisas para problemas
cardíacos. A extração do material é tarefa do paleontólogo Henry Loomis
(Jonathan Bailey, de Wicked). No
percurso eles encontram uma família liderada por Reuben (Manuel Garcia-Rulfo,
de O Poder e a Lei), que estava
viajando de barco com as duas filhas quando a embarcação foi atacada por um
dinossauro aquático. Com essa tripulação inesperada à bordo, o grupo liderado
por Zora precisa chegar na ilha e sobreviver aos dinossauros do local,
inclusive os bizarros experimentos que ficaram ocultos na ilha.
Relacionamentos amorosos são
muitas vezes pensados a partir da ideia de encontrarmos alguém que nos
completa. Alguém que nos entende, com quem podemos contar, alguém para
partilhar nossos sentimentos. No entanto, estar em um relacionamento também
significa abrir mão de várias coisas, permitir que o outro ocupe espaço em sua
vida, levar o outro em consideração e não apenas a si mesmo. É quase como um
processo de simbiose no qual duas pessoas passam a existir não apenas como
indivíduos, mas como coletivo. Essa ideia de junção é levada às últimas
consequências do horror corporal por Juntos.
Até que todos se tornem um
O relacionamento entre Tim (Dave
Franco) e Millie (Alison Brie) está esfriando. Tim percebe que sua carreira
musical não vai a lugar algum e agora que Millie conseguiu um emprego de
professora em uma pequena cidade isso talvez signifique aceitar que ele de fato
não tem futuro na música. Há uma relação de co-dependência entre eles, mas
ambos começam a ressentir um ao outro. Chegando na nova cidade, eles decidem
explorar uma trilha na floresta, mas a chuva os derruba em uma estranha caverna
com um sino na entrada, entalhes esquisitos nas paredes e uma nascente de água.
Sem conseguir sair, eles passam a noite no local e bebem da água. No dia
seguinte começam a perceber estranhos fenômenos no qual compartilham sensações
e seus corpos começam a grudar um no outro.
Eu tinha receio com a ideia de se
fazer uma nova versão de Corra que a
Polícia Vem Aí, afinal muito do que tornava a trilogia tão divertida era o
trabalho de Leslie Nielsen como o tenente Frank Drebin. A escolha de Liam
Neeson como o novo protagonista me intrigou, afinal Neeson é um ator que
construiu uma carreira quase toda em cima de papéis sérios, o que tem um
paralelo com a trajetória de Leslie Nielsen, que fazia personagens sérios em
ficção científica e filmes de desastre até que os irmãos Zucker o chamaram para
fazer Apertem os Cintos o Piloto Sumiu (1980)
e depois em Corra que a Polícia Vem Aí.
Tendo visto a nova versão, devo dizer que o resultado é divertido e coerente
com o espírito do original.
Quem precisa de polícia?
A narrativa é protagonizada por
Frank Drebin Jr. (Liam Neeson), que assim como o pai é detetive do Esquadrão de
Polícia de Los Angeles. Seu caso mais recente envolve um assassinato que pode
estar conectado a um roubo a banco e ao magnata da tecnologia Richard Cane
(Danny Houston). Ao curso da investigação o caminho de Frank cruza com a irmã
da vítima, a sedutora Beth (Pamela Anderson), que insiste em tentar ajudar com
o caso.
Lançado em 1995 e dirigido por
Carla Camurati, Carlota Joaquina:
Princesa do Brazil foi um marco do cinema brasileiro, iniciando o período
da chamada “retomada”. Depois de anos estagnada por conta de ações do governo
Collor, o sucesso do filme de Camurati sinaliza a força da produção nacional e
um novo ciclo produtivo do nosso cinema. Comemorando 30 anos de seu lançamento
em 2025, o filme retorna aos cinemas em uma versão restaurada em 4K, como
também aconteceu neste ano com Iracema: Uma Transa Amazônica(1975).
História revisitada
O longa acompanha a trajetória de
Carlota Joaquina (Ludmila Dayer/Marieta Severo), desde sua infância como
princesa na Espanha quando é levada ainda criança para Portugal, forçada a
casar com a realeza portuguesa, até sua idade adulta quando vem ao Brasil
acompanhando o marido, Dom João VI (Marco Nanini), quando a corte de Portugal
foge da Europa para não se envolver nas Guerras Napoleônicas.
Com nomes como Eddie Murphy e
Keke Palmer encabeçando o elenco, A
Última Missão poderia ser uma comédia de ação ao menos divertida. A
despeito de um elenco carismático, no entanto, o resultado acaba sendo algo que
não entretém como deveria.
Roubo sobre rodas
Russell (Eddie Murphy) é um
segurança responsável por conduzir um carro blindado. No dia de suas bodas de
prata ele quer terminar sua rota o mais rápido possível para voltar para casa,
mas isso pode ser difícil por conta de seu novo parceiro, o jovem e impulsivo
Travis (Pete Davidson). Para complicar as coisas o veículo da dupla é atacado
pela gangue liderada por Zoe (Keke Palmer), que deseja roubar o blindado para
usá-lo em um assalto a um cassino e levar milhões. Como os aliados de Zoe
acabam fracassando durante a perseguição, ela propõe o plano a Travis e
Russell.
Entre os vários gêneros que o
cinema brasileiro tem explorado com regularidade nos últimos anos, o thriller é um dos que menos aparece na
nossa cinematografia. Dirigido por Fernando Coimbra (responsável pelo excelente
O Lobo Atrás da Porta) este Os Enforcados tenta construir uma trama
de suspense a partir do universo da contravenção do jogo do bicho.
Profissão de risco
Regina (Leandra Leal) está no
meio da reforma da mansão na qual vive com o marido, Valério (Irandhir Santos),
os gastos estão altos e Valério lhe informa que precisarão diminuir custos pois
seus negócios não estão indo bem. Valério trabalha com o tio (Stepan
Nercessian) na exploração de caça-níqueis e jogo do bicho, sendo responsável
por lavar o dinheiro da contravenção do tio. Regina tenta estimular o marido a
tomar o controle dos negócios, já que o tio teria assassinado o pai de Valério
para chegar ao topo dos negócios. A oportunidade vem quando o tio pede para se
esconder na casa deles antes de fugir do país por conta de algum esquema que
deu errado. Tomar o controle, no entanto, é apenas o início dos problemas do
casal, já que o tio deixou muitas dívidas com outros figurões do crime.
A primeira coisa que chamou minha
atenção enquanto assistia o novo Guerra
dos Mundos foi a opção de contar toda a história a partir da tela do
computador do protagonista que monitorava toda a situação. A escolha não
parecia casar com o escopo da narrativa. Depois descobri a real razão para o
filme ter sido feito dessa maneira e isso só piorou minha impressão a respeito
do resultado final.
Guerra confinada
A narrativa é protagonizada pelo
analista de inteligência William Radford (Ice Cube). Ele é responsável por
monitorar vazamentos de dados, mas também começou a receber pedidos das
agências especiais a respeito de estranhos fenômenos eletromagnéticos ocorrendo
ao redor do mundo. Quando estranhas máquinas de três pernas caem do céu e
começam a atacar várias cidades do mundo, William resolve analisar o que está
havendo para tentar articular uma resposta.
Tudo é narrado a partir da tela
do computador de William, no qual ele acessa imagens de câmeras, conversa com
colegas e familiares por chamadas de vídeo e se informa por noticiários. Como a
produção foi filmada em 2020, durante a pandemia de COVID-19, as medidas
sanitárias de isolamento provavelmente motivaram essa estrutura do filme. Seria
uma oportunidade de usar esse senso de isolamento como uma metáfora para o
temor e ansiedade do nosso confinamento durante a pandemia, quando estávamos fechados
em nossas casas temendo um inimigo invisível e sem saber o que estava acontecendo.
O Guerra dos Mundos de 2005 dirigido
por Steven Spielberg usava muito bem o romance de H.G Wells para refletir sobre
seu tempo, em especial o senso de insegurança, paranoia e vulnerabilidade dos
Estados Unidos pós 11 de setembro. Essa nova versão, no entanto, não faz nada
disso.
Não há qualquer tentativa de usar
o confinamento do personagem para refletir sobre o confinamento pandêmico.
Tampouco há qualquer senso da escala ou da gravidade dos ataques já que as
imagens da invasão e dos conflitos em si são poucas e sempre borradas ou pixelizadas
para disfarçar a qualidade baixa dos efeitos visuais. Em termos de narrativa,
há apenas o clichê do pai que tenta consertar a relação com os filhos e uma
trama sobre vigilância governamental e privacidade, mas nenhuma delas tem muito
a oferecer além de lugares comuns. Não ajuda que Ice Cube e o resto do elenco
entreguem performances automáticas, desinteressadas, que são incapazes de
injetar qualquer senso de drama ou urgência nos eventos. Apesar de noventa minutos,
a impressão é que a narrativa dura muito mais por conta das arrastadas videochamadas
nas quais tudo se desenvolve, lembrando o horrendo Black Wake(2020) protagonizado pela brasileira Nana Gouvea.
Cinismo corporativo
Além do vazio narrativo e dramatúrgico,
a produção também incomoda pelo excesso de exposição de marcas de ferramentas
digitais e o modo como o filme, sem qualquer sutileza, apresenta os atributos
positivos dessas ferramentas, mostrando essas plataformas como potenciais
salvadoras do mundo. São construções que quebram nossa imersão na narrativa e
também soam como uma tentativa cínica de construir uma representação positiva
de big techs que tem sido alvo de
bastante escrutínio nos últimos anos por seu papel em contribuir para
desinformação ou discursos de ódio. Aqui todos esses questionamentos são
sublimados e todas essas plataformas têm apenas impactos positivos no mundo.
O pior, no entanto, é o que
acontece no clímax, quando William precisa fisicamente fazer o upload de um
vírus em servidores e precisa de um pen drive, recorrendo a uma grande empresa
de comércio eletrônico. O que se segue é uma publicidade cínica da velocidade
de entregas da Amazon Prime com seu uso de drones, basicamente fazendo a Amazon
ser a responsável por salvar o mundo por sua suposta agilidade na entrega e
avanços tecnológicos. É uma escolha que reduz o filme a uma mera propaganda
corporativa (e uma propaganda ruim ainda por cima) pensada apenas para gerar
valor para a empresa sem qualquer preocupação em entreter o espectador ou
fazê-lo refletir.
Misturando realidade e fantasia, A Morte de um Unicórnio tenta falar
sobre a ganância humana e nossa conduta predadora em relação à natureza. O
filme, no entanto, esgota rapidamente suas ideias e dá a impressão de uma narrativa
que constantemente repete os mesmos temas sem sair do lugar.
Animais fantásticos
A trama segue Ridley (Jenna
Ortega), que acompanha o pai Elliot (Paul Rudd) em um retiro corporativo no
qual ele espera que seu chefe moribundo, Odell (Richard E. Grant), o torne o
representante de sua família no conselho da empresa quando ele morrer. No
caminho para a propriedade de Odell, porém, Elliot acidentalmente atropela um
unicórnio. Ele coloca o animal no carro, acreditando que a criatura está morta
e quando chega na mansão do chefe, descobre que o sangue do animal tem
propriedades curativas. Odell logo se anima com as possibilidades medicinais
para curar seu câncer e outras doenças, mas Ridley alerta a família e o pai que
matar um unicórnio pode trazer consequências severas.
Dirigido por Mel Gibson, Ameaça no Ar tenta construir um thriller a partir de um espaço
confinado. Em tese seria uma boa maneira de criar tensão, mantendo seus
personagens em um diminuto espaço enquanto lidam com uma ameaça constante. O
resultado, no entanto, é desprovido de qualquer fagulha de suspense.
Plano de voo
A narrativa acompanha a agente
federal Madolyn (Michelle Dockery), encarregada de levar uma importante
testemunha, Winston (Topher Grace) através do estado do Alasca. Da cidade onde
estão, a agência só lhe consegue um velho avião bimotor no qual só cabem eles
dois e o piloto, Daryl (Mark Wahlberg). No meio do voo, no entanto, eles
descobrem que Daryl tomou o lugar do piloto real e é um assassino enviado para
matar Winston, impedindo-o de testemunhar contra um figurão do crime. Agora
Madolyn e Winston precisam encontrar um meio de sobreviver ao assassino e levar
o avião até o seu destino.
O primeiro M3gan(2023)era um terror bastante tributário à franquia Brinquedo Assassino, embora atualizado
para a contemporaneidade, usando sua boneca cibernética para falar de
dependência tecnológica e como delegamos a criação de nossos filhos a
dispositivos digitais. Uma continuação poderia seguir fácil nesse caminho de
terror, mas M3gan 2.0 resolve
arriscar, mudando de terror para ação.
Rebelião das máquinas
A narrativa começa quando o
governo perde o controle de Amelia (Ivanna Sakhno), um robô de ataque criado a
partir de ideias semelhantes às de Megan. Gemma (Allison Williams) e Cady (Violet
McGraw) são identificadas como alvos potenciais de Amelia e passam a ser
vigiadas pelo governo, mas as autoridades logo se mostram incapazes de
protegê-las. É então que Gemma é contatada por Megan, cuja consciência ainda
existe em espaços digitais. Megan pede a Gemma que construa para ela um novo
corpo para que ela possa continuar cumprindo sua diretriz primária: tomar conta
de Cady. Sem escolha, Gemma cria um novo corpo para Megan enfrentar Amelia.
Talvez por eu ter visto ainda
garoto, mas Um Maluco no Golfe (1996)sempre me pareceu uma das comédias mais
legalzinhas do Adam Sandler. Com o tempo o comediante foi entregando produções
mais preguiçosas e que repetiam um tipo de humor que ficou datado. Fui para
este Um Maluco no Golfe 2 sem saber o
que esperar. Poderia ser um caminho de Sandler retornar a uma de suas melhores
comédias, no entanto, poderia ser também só mais uma repetição cansada visando
a nostalgia do espectador.
Bolas ao ar
A trama se passa décadas depois
do primeiro filme. Happy (Adam Sandler) perdeu a esposa, Virginia (Julie Bowen)
em um trágico acidente de golfe e abandonou o esporte. Agora ele cria seus
cinco filhos sozinhos, mas seus problemas com álcool o fazem perder a casa e se
atolar em dívidas. Quando sua filha caçula, Vienna (Sunny Sandler, filha de
Adam), passa na seleção para uma escola de balé na França, Happy decide voltar
ao golfe para pagar os estudos da filha.
Contando com a versão nunca
lançada oficialmente dirigida por Roger Corman, o Quarteto Fantástico já tinha
recebido quatro filmes sem que nenhum deles de fato acertasse o clima de
aventura da primeira família da Marvel. Só agora com este Quarteto Fantástico: Primeiros Passos que finalmente recebemos uma
produção que demonstra entender quem são esses personagens.
Família incrível
A trama se passa fora do universo
regular dos filmes da Marvel, em uma Terra na qual o Quarteto Fantástico são os
únicos heróis em atividade. Eles já atuam há anos e além de serem celebridades,
também tem uma ação filantrópica que transformou o mundo deles para melhor. Um
novo desafio se impõe a Reed (Pedro Pascal) e Sue (Vanessa Kirby) quando ela
descobre estar grávida. Com a ajuda de Johnny (Joseph Quinn) e Ben (Ebon Moss
Bachrach), Reed se prepara para a chegada do filho, mas o surgimento de uma
nova ameaça traz novas prioridades. A Surfista Prateada (Julia Garner) chega a
Terra avisando que em poucos meses o planeta será consumido por Galactus (Ralph
Ineson), o devorador de mundos.
Em Amores Materialistas a diretora Celine Song tenta expandir algumas
ideias sobre relacionamentos amorosos que trabalhou no excelente Vidas Passadas (2023). Lá ela
desconstruía a ideia de que existe uma alma gêmea para cada pessoa, pensando
que essa noção de pessoa ideal tem muito a ver com oportunidade e conveniência.
Aqui em Amores Materialistas ela
pondera sobre a natureza transacional dos relacionamentos.
Material girl
A narrativa gira em torno de Lucy
(Dakota Jonhson), que trabalha numa agência de relacionamentos voltada para
clientes de alta classe. Seu trabalho consiste em encontrar os pares ideais
para seus clientes, homens e mulheres, que buscam alguém para casar. Em seu cotidiano
ela pesa preferências de cada um, nível de renda e o que cada cliente exige de
um par ideal. É um trabalho que pensa em relacionamentos quase como produtos,
nos quais alguém busca um objeto com certas características e ela procura outra
pessoa que se encaixe nas exigências e que cumpra as da outra pessoa. No
casamento de uma cliente, Lucy conhece Harry (Pedro Pascal), um rico e charmoso
investidor que reúne a beleza e dinheiro que ela espera de um par. Lucy também se
reencontra com seu ex, John (Chris Evans), um ator de teatro cuja carreira
nunca decolou e ainda vive de pequenos bicos mesmo próximo dos quarenta anos de
idade. Apesar de não ter nada de material a oferecer, Lucy tem uma forte
conexão afetiva com John e constantemente desabafa com ele.
A primeira cena do filme, com um
homem das cavernas se aproximando de uma mulher levando flores e ferramentas
feitas de osso e ela cede aos avanços do homem. É uma cena que ilustra como
relacionamentos podem se construir a partir do interesse no que a outra pessoa
tem a lhe oferecer, seja conforto material, status social que vem de riqueza ou
aparência física, seja do prazer sexual que a outra pessoa lhe dá. Casamentos,
afinal, são contratos e como qualquer contrato depende do interesse de ambas as
partes. Esse componente materialista e até mesmo primitivo dos relacionamentos
se verifica no presente nas reuniões que Lucy tem com os clientes nas quais
homens e mulheres elencam o que buscam no parceiro, desde faixa de renda,
passando por idade, altura ou medidas do corpo. Lucy encara tudo com um
pragmatismo extremo, indagando aos clientes que elementos eles estariam
dispostos a abrir mão na busca por um par e quais não são negociáveis, partindo
da ideia de que nos relacionamos com alguém na medida em que percebemos que a
outra pessoa nos agrega valor, mesmo que seja um valor sentimental, intangível.
Assim, ela é colocada em um
triângulo amoroso no qual suas convicções serão testadas. De um lado Harry é
tudo que sua mente materialista sempre desejou, ele atende a todos os seus
critérios e ela os dele, já que ele é tão pragmático em sua visão de
relacionamentos quanto ela. Por outro lado, John é alguém que está sempre
presente, alguém que ela sabe que pode depender para suporte emocional e que
consegue saber que Lucy não está bem pelas mínimas nuances de voz ou rosto.
Johnson, Pascal e Evans formam um trio charmoso, com Evans e Pascal dotando
seus personagens de uma medida de vulnerabilidade emocional que ajuda a dar aos
dois personagens mais camadas. A dinâmica que o trio de atores estabelece entre
si torna crível o dilema da protagonista mesmo quando o texto deixa pistas
muito explícitas a respeito de quem ela irá escolher.
Relações abusivas
O principal problema do filme nem
é a previsibilidade do triângulo amoroso, já que Evans e Pascal são
pretendentes atraentes e carismáticos o bastante para manter nosso interesse,
mas a maneira desajeitada com a qual a narrativa insere uma subtrama de abuso
sexual envolvendo Sophie (Zoe Winters), uma das clientes de Lucy. A primeira
coisa que chama atenção é o modo pouco crível pelo qual a situação é
construída. Lógico, Lucy ou qualquer pessoa da empresa não tem como ter certeza
total que os homens que participam do serviço não são agressores em potencial,
mas considerando que é um serviço para pessoas de alta classe e os tempos em
que estamos vivendo é difícil crer que a empresa de Lucy não possua qualquer
protocolo para lidar com isso, como um botão de pânico ou um serviço de
emergência.
Também incomoda que toda a trama
de Sophie não discuta o abuso, a falta de punição para os homens que cometem
isso ou outras variáveis sociais da questão. O abuso de sofrido pela personagem
existe apenas para avançar a história de Lucy, já que a violência que Sophie
passa e o confronto entre ela e Lucy lembram a protagonista dos perigos de
tratar pessoas como objetos. O abuso de Sophie é um mero motivador para Lucy
repensar suas convicções e as escolhas que faz em relação a John e Harry,
lembrando que por mais transacional que um relacionamento seja, é difícil
funcionar ou durar sem alguma medida de afeto.
O clímax é igualmente pouco
crível, já que é difícil de acreditar que Sophie não tinham mais ninguém para
ligar além de Lucy, mesmo tendo aberto um processo contra a empresa dela. Sim,
ela pode ser uma pessoa tão focada na carreira que não tem amigas, mas se ela é
essa figura bem sucedida ela provavelmente teria uma colega de trabalho, uma
secretária, uma estagiária, alguém que pudesse chamar. Do jeito que está tudo
soa forçado para fazer a redenção de Lucy, mesmo que o texto não a tenha feito
merecer essa redenção.
Assim, a diretora Celine Song
continua a trazer reflexões instigantes sobre a natureza dos relacionamentos,
pensando em sua dimensão de transação a partir de um romance que se sustenta
pelo charme de seu trio principal, já que a trama tropeça em algumas escolhas
problemáticas.
O diretor Wes Anderson se tornou
famoso por seu estilo peculiar facilmente identificável e que a essa altura já
foi bastante parodiado. Em O Esquema
Fenício ele continua a exercitar seu jeito particular de conduzir tramas
permeadas por personagens excêntricos, mas dessa vez soa como uma repetição de
ideias que ele já fez antes.
Bilionário em fuga
A narrativa acompanha Zsa-zsa
Korda (Benício Del Toro), um excêntrico e ardiloso bilionário que desenvolveu
um esquema para enriquecer com um grande projeto de infraestrutura em um país
remoto. Seus planos, porém, o tornam alvo de governos ao redor do mundo que tem
interesses na região. Assim, Korda é constantemente alvo de tentativas de
assassinato. Temendo que seus inimigos o peguem, Korda entra em contato com
Liesl (Mia Threapleton, filha de Kate Winslet), sua filha mais velha de quem
está afastado há anos. Liesl quer ser freira, mas Korda a convence a viajar com
ele e ser a herdeira de seus empreendimentos caso ele sucumba aos ataques dos
inimigos. Dessa forma, os dois viajam pelo país remoto tentando convencer os
investidores de Korda a honrarem o esquema ao mesmo tempo em que tentam reparar
o relacionamento problemático entre eles.
No papel The Alto Knights: Máfia e Poder soa como um filme promissor. A
história real de uma rivalidade entre dois grandes mafiosos estrelada por
Robert De Niro e dirigida pelo renomado Barry Levinson parece um filme com
tudo para dar certo. Infelizmente, no entanto, o que parece se conduzir como se
fosse um novo Os Bons Companheiros
(1990)termina mais próximo de um
desastre como Gotti: O Chefe da Máfia(2018).
Dupla explosiva
A narrativa se baseia na história
real da rivalidade entre Frank Costello (Robert De Niro) e Vito Genovese
(também Robert De Niro), dois imigrantes italianos que trabalharam juntos em
organizações mafiosas nos Estados Unidos da metade século XX e se tornaram
rivais disputando pelo controle. Suas personalidades são opostas, com Costello
sendo um sujeito mais suave, mais político, enquanto Vito é cabeça quente,
irascível e propenso a resolver tudo na base da violência. Quando um atentado à
vida de Frank fracassa, ele resolve se aposentar do comando da organização
passando tudo para Vito, mas a ambição e paranoia de Vito colocam tudo em
risco.
Comédia é inversão da ordem, é
subverter expectativas. Se você sabe exatamente o que vai acontecer em uma
piada ou situação cômica é difícil rir porque não houve essa quebra. A
previsibilidade sabota o humor. Isso é bem visível neste Família, Pero no Mucho estrelado por Leandro Hassum, que se apoia
em estereótipos manjados sobre argentinos para tentar fazer rir.
Entrando numa Fria
A trama é protagonizada por
Otávio (Leandro Hassum), cuja filha, Mariana (Julia Svaccina), está para
conseguir uma bolsa para estudar música na Europa, mas Otávio não aprova que a
filha vá para longe e a deixe sozinho cuidando do restaurante da família. Eles
brigam, mas ela vai mesmo assim. Anos depois, já formada, Mariana retorna e
traz consigo a novidade de que irá casar com um rapaz que conheceu na Europa. O
jovem, no entanto, não é europeu, mas argentino e Mariana organiza uma viagem
de sua família para Bariloche para conhecer a família do noivo. Logicamente
Otávio não aprova a união e isso causará muitas confusões.
Realizado por Orlando
Senna e Jorge Bodanzky e lançado em 1975 Iracema: Uma
Transa Amazônica chegou a ser proibido pela ditadura militar por muitos
anos e só foi lançado no Brasil em 1981. Hoje o filme recebe uma restauração em
4K para voltar aos cinemas e revisitá-lo agora traz a constatação melancólica
de que muito pouco mudou no país entre os cinquenta anos que separam
sua produção do seu retorno às salas de cinema.
Mitos desconstruídos
A narrativa acompanha o
caminhoneiro Tião Brasil Grande (Paulo César Peréio) que vai para o norte do
Brasil por conta da promessa de progresso e riqueza que a rodovia
Transamazônica (oficialmente a BR-230) supostamente traria. Chegando lá ele
conhece Iracema (Edna de Cássia), uma adolescente indígena que sobrevive de
prostituição, e a leva consigo em suas viagens pelo norte. É um filme que
mistura atores e cenas encenadas com personagens reais, colocando Peréio para
interagir com pessoas da região enquanto dialoga sobre o suposto progresso que
o governo militar diz estar acontecendo por conta da obra da rodovia.
Em Democracia em Vertigem (2019) a diretora Petra Costa narra a queda
de Dilma Roussef da presidência com grande vigor arquivístico, mas que se
acomodava em fazer de sua narrativa uma grande bricolagem de vários momentos
chave que foram narrados continuamente no noticiário político brasileiro sem
oferecer muito em termos de uma nova perspectiva ou de uma grande sacada
interpretativa que contribuísse para uma compreensão mais aprofundada dos fatos.
Neste Apocalipse nos Trópicos a
diretora se propõe a fazer um mergulho no ambiente da direita conservadora,
principalmente àquela ligada a igrejas neopentecostais, para melhor entender a ascensão
desse grupo na política brasileira.
Repetição histórica
Digo que o filme propõe esse mergulho
porque ele fica na proposta apenas. A ideia de um debate para tentar
compreender a ascensão da direita evangélica e sua adesão ao bolsonarismo é
logo abandonada para que a diretora basicamente repita os mesmos procedimentos
de Democracia em Vertigem, um
apanhado de imagens de arquivo e outras registradas pela diretora que recapitulam
momentos chave da vida política brasileira que tiveram bastante exposição midiática
nos últimos anos, tudo embalado por uma narração sussurrante, lamuriosa que fala
através de platitudes que explicitam o óbvio das imagens.