Artistas do desastre
A trama é centrada em Marina (Fernanda Torres), que tenta pressionar a prefeitura de sua pequena cidade a construir uma fossa para evitar que dejetos poluam o córrego da região. A secretaria responsável lhe informa que não há mais verba para obras naquele ano, no entanto, há disponível uma rubrica para a produção de um vídeo educativo que não foi usada e que Marina poderia dispor caso fizesse o tal vídeo. Pensando em usar o dinheiro para financiar a fossa, Marina decide produzir um vídeo sobre um monstro de poluição que ataca a cidade por conta da falta de saneamento básico. Para fazer isso recruta o marido, Joaquim (Wagner Moura), e dos amigos Cilene (Camila Pitanga) e Fabrício (Bruno Garcia).
A premissa faz uma crítica jocosa ao funcionamento por vezes kafkiano da máquina estatal e como é necessário encontrar brechas na burocracia para se conseguir o que quer. O vídeo é inicialmente um meio para um fim, com Marina pouco se importando se ele faz sentido, a qualidade ou boas atuações. O que ela quer é finalizar o material o mais rápido possível para receber o dinheiro da prefeitura e fazer a obra da fossa. Conforme o grupo começa a filmar, no entanto, se tornam mais envolvidos com a produção do vídeo e mais preocupados com os resultados.
A linguagem da arte
O arco de Marina e seus amigos acaba sendo também o de descobrir, meio que por tentativa e erro, o funcionamento da linguagem do cinema. Mal começam a filmar e percebem que certos diálogos que Marina escreveu no roteiro não funcionam como conversas naturais. Logo se dão conta de que explicações do texto precisam ser construídas em cena e buscam meios convincentes de fazer isso.
O grupo também vai descobrindo os vários elementos que são necessários para a produção de um filme, sendo obrigado a conseguir figurinos, maquiagem e até verba adicional, obrigando-os a fazer parcerias com o comércio local. É interessante como a trama do filme apresenta de maneira orgânica e sem didatismos uma defesa da importância econômica do audiovisual e como a produção de um filme mobiliza diferentes empresas ou fornecedores na cidade em que se realiza. A narrativa mostra a dimensão coletiva do fazer cinema, com cada personagem contribuindo para a produção e a necessidade de cada etapa produtiva, como a chegada do montador Zico (Lázaro Ramos) que mostra a necessidade de unidade para a edição final.
Mais que falar de cinema enquanto
atividade produtiva, o filme também pensa o cinema como um espaço de mobilizar
sentimentos, de dar vazão a nossas visões de mundo e como o labor artístico
pode ser apaixonante mesmo com todas as limitações. O filme feito pelos
personagens é obviamente tosco, mas é a paixão genuína deles por levar tudo a
cabo que faz tudo funcionar e acaba tornando a produção um sucesso. É um
lembrete de que um filme não precisa ser tecnicamente perfeito para envolver as
pessoas, que em muitos casos um sentido imperfeito pode ser mais interessante
do que uma perfeição sem sentido. Sim, o modo como tudo dá extremamente certo
para os personagens no final, com a cidade virando até um polo turístico por
conta da produção do filme, talvez seja um pouco simples e ingênuo demais, mas
está ali, como o restante do filme, para nos lembrar do poder transformador do
cinema.
Trailer
Nenhum comentário:
Postar um comentário