segunda-feira, 7 de julho de 2025

Crítica - Yõg Ãtak: Meu Pai, Kaiowá

 

Análise Crítica - Yõg Ãtak: Meu Pai, Kaiowá

Review - Yõg Ãtak: Meu Pai, Kaiowá
Ainda há uma espécie de senso comum equivocado de que a repressão da ditadura militar brasileira foi algo focado nos grandes centros urbanos e que quem estava à margem disso foi pouco afetado. O sucesso de Ainda Estou Aqui no ano passado e certas reações a ele mostrou como esse senso comum ainda está presente, falhando em entender como a ditadura também afetou populações fora desses centros urbanos, como as populações indígenas. O documentário Yõg Ãtak: Meu Pai, Kaiowá, conta exatamente uma dessas histórias de como comunidades indígenas foram impactadas nesse período.

Diáspora indígena

O filme parte da busca de Sueli Maxakali (uma das diretoras do filme) e sua irmã Maiza Maxakali, pelo pai delas, Luiz Kaiowá, de quem foram separadas quando eram pequenas ainda no período da ditadura militar. A narrativa conta como Luiz foi removido à força de seu território natal no Mato Grosso do Sul pelo então governo, sendo transportado por vários estados até chegar ao território dos Tikmũ’ũn (também chamados de Maxakali) em Minas Gerais, onde conheceu a mãe de Sueli e Maiza. Depois Luiz sofre um novo deslocamento forçado por parte do governo e perde o contato com a família que constituiu em Minas Gerais.

O filme é sobre essa busca, mas também sobre a constante luta dos povos indígenas em preservarem seu território que está sob constantes ameaças, seja de grileiros, seja de ações do Estado. Ele se constrói em cima de entrevistas e cenas encenadas que tentam reconstruir certos depoimentos. Não há aqui imagens de arquivo ou qualquer outro elemento do passado. Mesmo quando falam de eventos de décadas atrás, tudo é situado no presente.

A memória que falta

Claro, essa escolha é provavelmente motivada, entre outras coisas, pela falta de indícios materiais desse passado, seja em documentos, seja na forma de registros fotográficos, então resta o exame da memória enquanto fabulação. Fabulação presente tanto em tentativas de encenar o passado quando nas versões diferentes dos eventos passados narrados pelos diferentes envolvidos.

Nessa escolha fica evidente que o documentário está menos interessado em uma reconstrução factual do que aconteceu e mais em um registro dessa ausência e como a violência do passado se plasma também numa violência contra a memória desse povo que sequer foi permitido ter os meios para lembrar devidamente o que aconteceu e como essa violência contra a memória revela também uma tentativa de apagamento dessas populações.

O documentário, porém, também tem outros eixos, como a luta por preservar seu território ou registrar a cultura e cosmovisão desses povos. Todos temas importantes, mas, considerando a duração relativamente curta do documentário nem sempre todas essas ideias são trabalhadas a contento ou devidamente contextualizadas para um público que pode não ter familiaridade com essa realidade.

Ainda assim, Yõg Ãtak: Meu Pai, Kaiowá é um importante registro das violências cometidas no passado e no presente contra as populações indígenas no Brasil, resgatando o impacto que a ditadura militar teve sobre esses povos.

 

Nota: 7/10


Trailer

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