quarta-feira, 27 de maio de 2015

Crítica - Promessas de Guerra


Já foram feitos muitos filmes sobre os horrores e dores da guerra. Muitos deles sobre a Segunda Guerra Mundial, o Vietnã e as invasões recentes ao Oriente Médio. Porém, em geral, pouca atenção é dada à Primeira Guerra Mundial e é exatamente sobre esse período que irá tratar este Promessas de Guerra, estreia do ator Russel Crowe na direção.

Acompanhamos o fazendeiro australiano Joshua Connor (Russel Crowe) que parte para a Turquia em busca dos três filhos, mortos em combate durante a guerra. Ao chegar no país se depara com a hostilidade dos nativos bem como a confusa burocracia militar que envolve a busca dos corpos. Percebendo que as autoridades são incapazes de lhe dar aquilo que procura, Connor decide ir por conta própria em busca dos filhos.

Crowe se sai relativamente bem em sua estreia na direção, tecendo uma narrativa que nos mostra como a guerra traz consequências mesmo para aqueles que não combateram e como este tipo de conflito nos desumaniza e nos afasta das outras pessoas. Não é exatamente nada de novo, mas é bem conduzido o suficiente para nos mobilizar e envolver com esta história. Seu trabalho de câmera convoca a dimensão grandiosa do outback australiano e das paisagens desoladas dos campos de batalha da Turquia, enquanto as batalhas de trincheiras dos flashbacks são filmadas em planos fechados e com constantes movimentos de câmera dando um ar claustrofóbico e aterrorizante aos eventos. O uso da música, por outro lado, nem sempre é bem sucedido e muitas vezes ela soa demasiadamente intrusiva, pesando a mão no sentimentalismo em cenas que já são carregadas de enorme dramaticidade. 


O filme acerta na construção dos personagens, em especial o protagonista e o militar turco Hasan (Yilmaz Erdogan). Crowe empresta ao seu personagem sua persona rústica, concebendo-o como um sujeito teimoso, porém engenhoso, que vai para a Turquia não apenas para cumprir a promessa que fez à esposa, mas para reencontrar algum propósito em sua vida. Já Erdogan traz uma grande complexidade a Hasan, um homem patriota que verdadeiramente quer proteger seu país da ocupação estrangeira, embora tenha plena consciência da violência que utilizou durante a guerra, trazendo sempre uma expressão serena, mas carregada de pesar. O resto do elenco, no entanto, não chega no mesmo nível dos dois, com Olga Kurylenko jamais conseguindo tirar a dona de hotel Aysha da zona do clichê (embora seja mais culpa do roteiro do que dela) e o tenente Hughes de Jai Courtney tem a mesma presença apática que o ator constantemente exibe em seus trabalhos, seja em Divergente (2014), Duro de Matar: Um Bom Dia Para Morrer (2013) ou Jack Reacher: O Último Tiro (2012).

É no roteiro, entretanto, no qual residem boa parte dos problemas da obra. Além do já citado arco clichê e previsível da personagem Aysha, que além de tudo é resolvido muito rápido e com muita facilidade, temos também alguns outros desenvolvimentos problemáticos. O primeiro deles é a cena em que Connor encontra os corpos ainda no início do filme.

O enquadramento e movimento de câmera da cena parece relacionar esse momento com a cena inicial do filme em que o fazendeiro encontra água no subsolo, mas, convenhamos, encontrar água é diferente de cadáveres, sem falar que o personagem está sem seus instrumentos. Ainda que isso fosse aceitável, não explica o uso da montagem paralela do protagonista caminhando entrecortadas por flashbacks de seus filhos em batalha, como se Connor fosse um Sherlock Holmes do outback e pudesse reconstituir a batalha inteira apenas observando o ambiente. Além disso esse mesmo flashback será repetido (de maneira expandida) ao fim do filme quando ele descobre seu último filho, fazendo seu uso inicial soar redundante.

Outro problema é quando o filme parece não saber para onde ir em seu terço final e as barreiras narrativas são resolvidas com um deus ex machina grosseiro no qual o personagem sonha com o lugar no qual encontrará o filho restante. Esse momento, bem como o anteriormente citado parecem sugerir algum tipo de capacidade mediúnica ou ligação sobrenatural entre ele e os filhos, mas isso, no entanto, nunca é abordado ou explicitado, fazendo esses desenvolvimentos parecerem gratuitos e forçados.

O texto peca também por tratar as razões do conflito de modo relativamente ingênuo e romantizado. É compreensível a tentativa de evitar tornar as coisas maniqueístas demais, porém o modo como filme trata isso, apesar de evitar essa armadilha, continua simplificando demais as coisas, como o momento em que Connor diz que a Austrália entrou para a guerra por princípio, quando há claras questões de subalternidade colonialista envolvendo Austrália e Grã-Bretanha. Do mesmo modo, quando Hasan diz que a Turquia sempre foi uma nação pacífica até ser invadida durante a guerra, parece uma simplificação rasteira da história da nação.

Assim sendo, embora tenha alguns problemas de roteiro e ocasionalmente pese a mão no sentimentalismo, Promessas de Guerra é uma estreia competente de Russel Crowe como diretor.


Nota: 6/10

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