quarta-feira, 28 de novembro de 2018

Crítica – As Viúvas


Análise Crítica – As Viúvas


Review – As Viúvas
Minha reação inicial ao saber que o projeto seguinte do diretor Steve McQueen seria um filme de assalto como este As Viúvas foi de estranhamento. McQueen foi responsável por filmes como 12Anos de Escravidão (2013), Shame (2011) e Fome (2008), trabalhos sobre pessoas vulneráveis e à margem, então a ideia de que ele embarcaria em um tipo de filme mais convencional parecia, à primeira vista, motivada por dinheiro. Por outro lado, outros diretores já tinham migrado para gêneros mais populares sem, no entanto, abrirem mão dos temas que tornam suas obras tão singulares. Spike Lee fez isso no excelente Plano Perfeito (2006), que, por baixo do verniz de filme de roubo, trazia o olhar típico de Lee para questões de classe, etnia e reparação social e agora McQueen faz o mesmo com As Viúvas.

A narrativa acompanha Veronica (Viola Davis), uma mulher que recentemente perdeu o marido, Harry (Liam Neeson) morto durante um assalto que deu errado. O problema é que o marido de Veronica roubou dinheiro de um poderoso gângster, Jamal (Brian Tyree Henry), que agora é candidato a vereador e pressiona Veronica pelo dinheiro roubado. Acuada, Veronica procura as viúvas dos outros ladrões mortos, Linda (Michelle Rodriguez) e Alice (Elizabeth Debicki), para juntas realizarem um roubo que Harry planejou antes de morrer e assim consigam o dinheiro para pagar Jamal e reconstruírem suas vidas.

terça-feira, 27 de novembro de 2018

Crítica – Supa Modo


Análise Crítica – Supa Modo


Review – Supa Modo
O longa-metragem queniano Supa Modo começa com duas crianças estão assistindo a um exagerado filme de artes marciais oriental. O filme termina e as duas saem empolgadas, conversando sobre quem seria melhor, se Jet Li, Jackie Chan ou Bruce Lee. É uma conversa trivial, mas que ajuda a entender o tom do filme, já que logo depois da cena descobrimos que a garota, Jo (Stycie Waweru), está com câncer terminal e como só tem dois meses de vida, a família tirá-la do hospital para que ela passe os últimos dias em casa.

A escolha de mostrar Jo como uma criança como qualquer outra ao invés de já iniciar nos comunicando de sua grave doença ajuda que não a vejamos como uma coitada ou uma vítima, mas como uma garota cheia de vida e energia. Retornando à casa e sem perspectiva de melhora, a irmã de Jo, Mwix (Nyawara Ndambia), decide aproveitar o tempo que a irmã tem restando para fazê-la viver o sonho de ser uma super-heroína.

segunda-feira, 26 de novembro de 2018

Crítica – Robin Hood: A Origem


Análise Crítica – Robin Hood: A Origem


Review – Robin Hood: A Origem
É impressionante como Hollywood parece não saber o que fazer com a mítica figura de Robin Hood. Em tese é um personagem atemporal, afinal enquanto existir desigualdade social a figura de Robin permanece relevante. Por outro lado, a indústria estadunidense parece rejeitar veementemente o estilo “capa e espada” (ou swashbuckling em inglês) das histórias do personagem, com aventureiros charmosos, salões de baile e pessoas se balançando em lustres.

Ridley Scott já tinha tentando fazer um Robin Hood como épico histórico que falhou miseravelmente e agora essa nova versão tenta transformar a história do personagem em uma espécie de cópia safada dos filmes dos super-heróis da DC dirigidos pelo Zack Snyder. Considerando que a própria Warner/DC está se afastando do modelo “snyderiano” (e o sucesso comercial abaixo do esperado deste formato), este Robin Hood: A Origem é um filme que já nasce datado, superado e anacrônico. É o equivalente cinematográfico de um bebê natimorto.

Na trama, o nobre Robin de Loxley (Taron Egerton) retorna das cruzadas para descobrir que o Xerife de Nottingham (Ben Mendelsohn) confiscou todas as suas propriedades e sua amada Marian (Eve Hewson) está casada com um líder local Will (Jamie Dornan). Destituído, Robin acaba se aliando ao mouro John (Jamie Foxx) para derrubar o Xerife.

Crítica - Rafiki


Análise Crítica - Rafiki


Review - Rafiki
Kena (Samantha Mugatsia) e Ziki (Sheila Munyiva) são filhas de dois políticos rivais que estão disputando a eleição para vereador. Quando as duas se apaixonam, precisam decidir se viverão abertamente esse romance, tanto por conta de suas famílias quanto do preconceito da sociedade, ou se continuarão escondidas e em segurança. Esse é o conflito no centro do queniano Rafiki, segundo longa-metragem da diretora Wanuri Kahiu.

A primeira metade do filme trata o enlace romântico das duas com uma certa ingenuidade romântica, como se estivéssemos diante de uma comédia romântica qualquer. Nenhuma das duas parece ter qualquer problema (embora boa parte das pessoas ao redor delas tenha) em estar apaixonada por uma mulher ou questionam a própria sexualidade. O filme trata esse romance homossexual com a mesma naturalidade que boa parte das comédias românticas tratam romances heterossexuais e, com isso, manifesta um ideal de igualdade. Amor e romance são amor e romance independente dos gêneros das pessoas envolvidas.

sexta-feira, 23 de novembro de 2018

Crítica – Marvel’s Spider-Man: Guerras Territoriais


Análise Crítica – Marvel’s Spider-Man: Guerras Territoriais


Review – Marvel’s Spider-Man: Guerras Territoriais
Guerras Territoriais, segundo DLC do excelente Marvel’s Spider-Man, continua mais ou menos do ponto em que O Assalto parou. O gângster Cabeça de Martelo (Hammerhead) ampliou ainda mais seu poder e influência entre os criminosos da cidade, iniciando um reino de terror por Nova Iorque. Cabe ao Homem-Aranha, com a ajuda da capitã Yuri Watanabe, deter o criminoso.

Preciso admitir que me surpreendi pelos caminhos sombrios que a narrativa me levou, explorando a elevação das tensões depois que um esquadrão da capitã Watanabe é assassinado pelo Cabeça de Martelo e a policial para em uma sangrenta e desesperada busca por vingança. Durante a campanha principal Yuri era basicamente um veículo de diálogos expositivos e “fornecedora de missões”, mas aqui ela ganha bastante nuance conforme é afetada pelas consequências brutais do seu duelo com a máfia e vai abandonando seus valores em sua sanha vingativa.

quinta-feira, 22 de novembro de 2018

Crítica - Los Silencios


Análise Crítica - Los Silencios


Review - Los Silencios
São muitos os silêncios que marcam este Los Silencios, da diretora Beatriz Seigner. Os silêncios provocados por ausência, os silêncios daqueles que não têm voz diante dos caprichos dos poderosos e o silêncio daqueles que morreram e por isso são incapazes de contar suas histórias.

A trama é centrada em Amparo (Marleyda Soto), uma mãe de dois filhos que tenta fugir da zona de conflito em que vive na Colômbia. Ela vai para a zona de tríplice fronteira entre Colômbia, Peru e Brasil, se instalando em uma casa de palafita em uma ilha localizada no meio do Rio Amazonas e que formalmente não pertence a nenhum dos três países. Lá, ela encontra o marido (Enrique Diaz), que supostamente estava morto.

O filme traz uma mistura de realismo social com realismo fantástico. Falo em realismo social pelo fato de registrar o cotidiano de uma comunidade que literalmente não pertence a lugar nenhum (a “Ilha da Fantasia”) realmente existe, mostrando o desafio diário de viver em um local que está aos sabores das cheias e vazantes do rio, mesclando atores profissionais com um elenco de não atores formados pela comunidade. O realismo fantástico, por outro lado, se manifesta na literal presença de fantasmas que interagem com os vivos.

Vencedores do XIV Panorama Internacional Coisa de Cinema


Vencedores do XIV Panorama Internacional Coisa de Cinema


O XIV Panorama Internacional Coisa de Cinema encerrou ontem e distribuiu os prêmios das suas mostras competitivas. Na competitiva nacional, o longa Luna foi escolhido como o melhor pelo júri oficial, enquanto que Ilha foi o eleito do júri jovem, recebendo também uma menção honrosa do júri oficial. Na competitiva baiana, o júri oficial premiou o documentário Bando, um filme de, dirigido por Lázaro Ramos e o júri jovem premiou o documentário Dr. Ocride. Confiram abaixo a lista completa de vencedores.

quarta-feira, 21 de novembro de 2018

Crítica – A Voz do Silêncio


Análise Crítica – A Voz do Silêncio


Review – A Voz do Silêncio
A Voz do Silêncio é um daqueles filmes que constroem um grande mosaico de personagens, transitando entre diferentes histórias que eventualmente se conectam de alguma maneira. Me lembrou bastante o excelente Magnólia (1999), de Paul Thomas Anderson, não só pela sua estrutura de mosaico, como também pela temática de pessoas solitárias em busca de afeto ou alguma conexão e pelo eventual uso de uma ocorrência cósmica/fantástica/sobrenatural para arrematar todas essas histórias. No filme de Anderson é uma chuva de sapos retirada do Velho Testamento, aqui é um eclipse lunar que deixa a Lua vermelha.

Como acontece em muitas tramas que saltam constantemente entre múltiplos personagens e narrativas, o resultado aqui é irregular e nem todas as histórias envolvem como deveriam. A mais eficiente é a que envolve uma mulher solitária em seu apartamento, interpretada por Marieta Severo, falando sobre o filho que está viajando pelo mundo. É uma das tramas que o filme dá mais tempo de tela e talvez seja por isso que ela envolva mais que as demais, além, claro do trabalho de Marieta Severo como uma senhora que parece cada vez mais deslocada da própria realidade e anestesiada pela televisão.

Crítica – Ilha


Análise Crítica – Ilha


Review – Ilha
Em um determinado momento de Ilha, um personagem diz algo do tipo “nosso cinema é subdesenvolvido por natureza”. A frase serve como uma chave para entender o filme e as escolhas estéticas e temáticas feitas nele. Durante os anos 60 e 70, críticos, pesquisadores e cineastas como Glauber Rocha, Fernando Solanas, Octavio Getino ou Júlio García Espinosa já falavam sobre como o cinema poderia servir aos países latino-americanos para refletir sobre seu próprio subdesenvolvimento e condição colonizada.

Termos como “estética da fome”, “cinema impuro” ou “cinema imperfeito” eram usados por esses autores para falar de filmes feitos com poucos recursos e que acabavam deixando de lado a preocupação com uma perfeição da pureza ou perfeição estética em virtude da necessidade urgente de contar histórias sobre pessoas e comunidades marginalizadas que não tem suas vozes ouvidas. Ilha bebe nessa fonte, adotando uma estética propositalmente “suja” para tecer uma trama metalinguística sobre a natureza da representação cinematográfica e a vida no extremo sul da Bahia.

terça-feira, 20 de novembro de 2018

Crítica – Parque do Inferno


Análise Crítica – Parque do Inferno


Review – Parque do Inferno
Entrando para assistir este Parque do Inferno, a impressão é de que seria uma versão piorada de Pague Para Entrar, Reze Para Sair (1981), um terror oitentista dirigido por Tobe Hooper, responsável por O Massacre da Serra Elétrica (1974). Tendo visto Parque do Inferno posso dizer que, bem, é isso mesmo.

A trama segue Natalie (Amy Forsyth) uma garota certinha que desde os primeiros minutos fica evidente que será a única a sobreviver ao que acontecerá. Junto com algumas amigas de faculdades e seus respectivos namorados, Natalie vai a um parque que é montado na cidade toda época de Dia das Bruxas e que já foi palco de um assassinato dois anos antes. Os amigos de Natalie todos falam de bebida e sexo, o que em termos de terror slasher significa que eles obviamente irão morrer.

Aí reside o primeiro problema. O filme se apoia em clichês velhos, cujo próprio cinema hollywoodiano já apontou a obviedade a exemplo da franquia Pânico ou o metalinguístico o Segredo da Cabana (2012). Ainda assim, Parque do Inferno recicla toda essa miríade de lugares comuns sem um quantum de ironia ou autorreflexividade, aderindo acriticamente a fórmulas manjadas e previsíveis.

Crítica – Deslembro


Análise Crítica – Deslembro


Review – DeslembroA diretora Flávia Castro já tinha abordado a questão dos desaparecidos políticos da ditadura militar brasileira em seu documentário Diário de uma Busca (2010) no qual ela tentava desvendar a morte do pai, um dos muitos desaparecidos políticos do período. Ela volta a esse período, agora com um filme de ficção, neste Deslembro.

Joana (Jeanne Boudier) é uma adolescente brasileira que morou boa parte de sua vida na França depois que sua mãe fugiu do Brasil por conta da ditadura militar e seu pai foi morto pelo mesmo regime. Por conta da lei de anistia, sua família agora pode retornar ao país, mas Joana não está contente em retornar a um país que, para ela, é sinônimo de morte e tortura. No Brasil, memórias perdidas de infância vão aos poucos retornando a Joana e ela vai tentando entender o que aconteceu com o pai.

O senso de deslocamento de Joana em relação ao Brasil é denotado por escolhas bastante deliberadas de quando ela fala em português ou em francês. Sempre que a personagem se sente desconfortável ou incompreendida, como na cena em que ela pergunta à mãe o que significa ser desaparecido político, ela recorre ao francês quase como um mecanismo inconsciente para demonstrar o quanto ela se sente estrangeira aqui. Esse sentimento de inadequação também é percebido em outras falas da personagem, como a breve pausa que ela dá antes de falar “vó” em uma conversa com a avó ao telefone, como se a ideia de ter uma avó, uma mulher que ela mal conhece, ainda não lhe soasse natural.

segunda-feira, 19 de novembro de 2018

Crítica – Infiltrado na Klan


Análise Crítica – Infiltrado na Klan


Review – Infiltrado na Klan
Iniciar um texto sobre Infiltrado na Klan não é fácil, ainda mais quando eu ainda estou sentindo o impacto do filme sobre mim e talvez seja difícil articular uma opinião sobre ele mesmo dias depois de tê-lo visto, mas tentarei fazer o meu melhor. A verdade é que o diretor Spike Lee, em seu melhor filme desde A Última Noite (2002), coloca o dedo em uma ferida social que muitas vezes ignoramos ou subestimamos a periculosidade por tempo demais, lembrando de como muitos eventos atuais acontecem porque não prestamos atenção à nossa história de preconceito e segregação. Digo nossa porque por mais que Lee se detenha a algo ocorrido nos Estados Unidos, muito do que ele retrata da ascensão do preconceito e intolerância é análogo à nossa história, em especial nossa história (muito) recente.

A trama é baseada na história real passada no interior dos Estados Unidos na década de 70. Ron Stallworth (John David Washington, filho do Denzel Washington) se torna o primeiro policial negro da cidade de Colorado Springs e decide se infiltrar na organização racista Klu Klux Klan para aprender mais sobre eles e o que planejam fazer na cidade. Ele consegue estabelecer contato com as lideranças da organização por telefone, mas sendo Ron um homem negro e seus alvos supremacistas brancos, ele não pode ir para os encontros, deixando a tarefa para o colega Flip (Adam Driver), um policial branco e judeu que também não apreço pela Klan.

Crítica – Tinta Bruta


Análise Crítica – Tinta Bruta


Review – Tinta Bruta
Tinta Bruta é, antes de mais nada, uma narrativa sobre solidão. O filme trata de outros temas como homofobia ou o distanciamento causado por redes sociais, mas é o isolamento vivenciado pelo protagonista e sua necessidade de tentar romper com essa existência solitária que funciona como força motriz da trama.

A história é centrada em Pedro (Shico Menegat), um jovem de Porto Alegre que foi expulso da faculdade e enfrenta julgamento pelo delito que levou à expulsão. Ele não tem amigos e vive com a irmã, que está de malas prontas para assumir um novo emprego em Salvador. A única ocupação de Pedro são os shows eróticos que faz via webcam no qual dança e tira a roupa para espectadores pagantes enquanto se pinta com tintas neon. Sua audiência, no entanto, está caindo e ele descobre o motivo ao conhecer Leo (Bruno Fernandes), um estudante de dança que também faz performances via webcam com neon. Inicialmente, Pedro procura Leo para pedir que o dançarino pare de copiar seu estilo, mas aos poucos os dois vão se aproximando e se apaixonando.

Crítica – A Sombra do Pai


Análise Crítica – A Sombra do Pai


Review – A Sombra do Pai
A sociedade delimita papéis e condutas muito claras para homens e mulheres. Quem nunca ouviu frases como “homem não chora”? São chavões que à primeira vista podem até parecer inocentes, mas constroem um ideal limitador e tóxico do que é a masculinidade. A Sombra do Pai, da diretora Gabriela Amaral Almeida, vai examinar esse distanciamento emocional masculino a partir de uma chave de filme de terror.

A garota Dalva (Nina Medeiros) perdeu a mãe recentemente, mas a tia, Cristina (Luciana Paes), acaba preenchendo esse vazio na vida da menina, morando com ela e o pai, Jorge (Júlio Machado). Cristina é adepta a realizar algumas simpatias usando uma imagem de Santo Antônio para tentar arrumar um marido e diz que Dalva tem um dom natural para se comunicar com o sobrenatural e fazer as coisas acontecerem. Quando Cristina anuncia que vai se casar e vai morar longe de Dalva, a menina começa a pensar em alguma maneira de trazer de volta a falecida mãe para não ter que ficar sozinha com o distante (física e emocionalmente) pai.

domingo, 18 de novembro de 2018

Crítica – Luna


Análise Crítica – Luna


Review – Luna
Uma garota percebe olhares diferentes dos colegas de escola. Ela então pega o celular e começa a chorar com o que vê. Em casa, mensagens abusivas e agressivas chegam a ela via redes sociais. Sentindo-se acuada, ela grava um vídeo para a mãe que mais soa como uma carta de suicídio. Tudo isso acontece nos primeiros minutos de Luna e se essa premissa parece mais uma história trágica de cyberbullying e slut shaming, o que o diretor Cris Azzi faz a seguir consegue subverter nossas expectativas.

A trama é centrada em Luana (Eduarda Fernandes), uma adolescente cuja vida é aparentemente banal. Ela faz amizade com Emília (Ana Clara Ligeiro), recém-chegada à sua escola. A amizade com Emília faz Luana explorar sua sexualidade e também a frequentar chats de vídeo via internet no qual Luana conversa com outras pessoas usando uma máscara e nome falso para proteger a própria identidade.

Durante boa parte da projeção, Luna é uma trama bem típica de amadurecimento e autodescoberta, mas que conquista pelo carisma e naturalidade que as intérpretes de Luana e Emília têm juntas. Aos poucos, no entanto, seu olhar vai passando do amadurecimento para as tensões enfrentadas pelas mulheres ao explorar o próprio corpo. De um lado há o medo das represálias sociais, o temor de ser “mal vista” ou criticada por se sentir segura ou confortável consigo mesma. Do outro, há o temor disso atrair a atenção de predadores, da violência sexual e abusos físicos.

sábado, 17 de novembro de 2018

Crítica – Azougue Nazaré

Análise Crítica – Azougue Nazaré


Review – Azougue Nazaré
Uma consulta ao dicionário revela que a palavra “azougue” está associada ao elemento químico mercúrio. Também me diz que a palavra se refere a alguém com muita vivacidade e inquietude. Os dois adjetivos casam muito bem com Azougue Nazaré, primeiro longa-metragem de Tiago Melo.

A trama se passa na cidade de Nazaré da Mata, interior de Pernambuco, e acompanha um grupo de personagens ligados a um clube de maracatu da cidade, mostrando os desafios deles para montar o espetáculo para o próximo carnaval, bem como as tensões entre aqueles que acompanham as tradições seculares do maracatu e os líderes de igrejas evangélicas locais. Uma das figuras centrais da trama é Tião (Valmir do Coco), que durante as apresentações de maracatu assume a persona de Catita Daiana.

O filme cria uma atmosfera enérgica, vibrante e com um quê de misticismo em relação ao maracatu. Caboclos de lança vagam pelas ruas e canaviais da cidade como um lembrete constante de que esta tradição cultural é algo vivo daquele local e está em constante movimento. A trama por vezes dá guinadas inesperadas, levando o espectador por insólitos caminhos, ainda que ocasionalmente deixe elementos em aberto ou sem conclusão. Essas não resoluções, no entanto, soam mais como uma escolha deliberada do que descuido, revelando como essas pessoas vivem tanto para o carnaval e o maracatu que deixam de lado outros aspectos de sua vida.

quinta-feira, 15 de novembro de 2018

Crítica – Temporada


Análise Crítica – Temporada


Review – Temporada
Assim como já tinha feito em Ela Volta Na Quinta (2014), o diretor André Novais mais uma vez tece um retrato da vida cotidiana carregado de afeto, naturalidade e reflexões sobre a relação das pessoas com os espaços urbanos neste Temporada.

A trama é centrada em Juliana (Grace Passô) que se muda para Contagem, região metropolitana de Belo Horizonte por conta de um novo emprego. Ela começa a trabalhar com prevenção à dengue, fiscalizando as residências de uma comunidade periférica. Em seu emprego, ela encontra situações insólitas nas casas dos moradores e também cria amizades com seus novos colegas de trabalho, em especial o despojado Russão (Russo APR).

Novais nos apresenta a esses personagens e ao seu universo com uma naturalidade enorme, como se de fato estivéssemos acompanhando o cotidiano de pessoas reais, sendo cúmplices de suas vidas, de suas vitórias, de seus problemas. Faz isso com muita delicadeza, sem chamar atenção para si e deixando que até mesmo pequenas coisas, como a mobília de um cômodo, nos contem sobre o percurso de suas personagens. Um exemplo são as mudanças que ocorrem no quarto de Juliana ao longo do filme. Se no início ela dorme em um quarto vazio, com apenas um colchão no chão, aos poucos o quarto vai sendo decorado e mobiliado com cama, armário e outros itens, tudo isso denotando as raízes que Juliana fixa naquele lugar.

quarta-feira, 14 de novembro de 2018

Crítica – The Sinner: 2ª Temporada


Análise Crítica – The Sinner: 2ª Temporada


Review – The Sinner: 2ª Temporada
The Sinner tinha sido inicialmente anunciada como uma minissérie, mas diante do sucesso obtido, a emissora anunciou que faria uma segunda temporada. Por melhor que tivesse sido a série, não fiquei exatamente empolgado, afinal a história de Cora (Jessica Biel) se encerrava perfeitamente. Informações posteriores me deixaram um pouco mais esperançoso quando soube que a segunda temporada de The Sinner não seria uma continuação da trama de Cora, mas um crime totalmente novo e o único personagem que continuaria seria o detetive Ambrose (Bill Pullman).

A segunda temporada é centrada no garoto Julian (Elisha Hennig) que aparentemente mata os pais durante uma viagem em família. A natureza pouco usual do crime faz a policial Novack (Heather Paul) pedir ajuda de Ambrose, que é um velho amigo de seu pai. Assim, a dupla começa a investigar os motivos que teriam levado o garoto a envenenar os pais, mas o mistério os leva a uma isolada comunidade alternativa com ares de culto liderada pela misteriosa Vera (Carrie Coon).

terça-feira, 13 de novembro de 2018

Crítica – She-Ra e as Princesas do Poder: 1ª Temporada


Análise Crítica – She-Ra e as Princesas do Poder: 1ª Temporada


Review – She-Ra e as Princesas do Poder: 1ª TemporadaImaginei que esta primeira temporada de She-Ra e as Princesas do Poder fosse ser mais um desses revivals de produtos culturais oitentistas que não tinha nada a oferecer para sua audiência além do apelo da nostalgia. O que encontrei, no entanto, foi o contrário disso, sendo uma animação muito preocupada com o desenvolvimento dos seus personagens.

A trama é centrada em Adora. Nesta nova versão, Adora é uma recruta da Horda, o exército do maligno Hordak. Ela foi criada desde pequena pela maga Sombria e treinou desde sempre ao lado da amiga Felina. Durante uma missão de rotina, Adora encontra uma misteriosa espada mágica e fica presa em uma ruína ancestral ao lado de dois guerreiros da Resistência, a princesa Cintilante e o Arqueiro. Ao lado dos dois, Adora descobre as reais intenções da Horda e decide se aliar à Resistência. Munida de sua nova espada, ela se torna a poderosa She-Ra.

A narrativa não trata apenas dessa descoberta por parte de Adora de que ela estava do lado errado da guerra, mas também o processo de aprendizado dela em se tornar a heroína que todos esperam que ela seja. Aos poucos ela aprende que não pode confiar apenas em seus poderes, mas que sua capacidade de inspirar as pessoas e dar-lhes uma razão para lutar e ter esperança é tão importante quanto sua força física.

segunda-feira, 12 de novembro de 2018

Crítica – Animais Fantásticos: Os Crimes de Grindelwald

Análise Crítica – Animais Fantásticos: Os Crimes de Grindelwald

Review – Animais Fantásticos: Os Crimes de Grindelwald
Quando escrevi sobre Animais Fantásticos e Onde Habitam (2016), mencionei que era uma aventura divertida, mas que nunca dizia a que veio, com muitas tramas que não se juntavam em um todo coeso. Animais Fantásticos: Os Crimes de Grindelwald apresenta os mesmos problemas do anterior e com menos charme.

Meses depois dos eventos do primeiro filme, Newt Scamander (Eddie Redmayne) está de volta à Inglaterra e foi proibido de sair do país pelo Ministério da Magia por conta do que aconteceu em Nova Iorque. Enquanto isso, o bruxo Grindelwald (Johnny Depp) foge da prisão e vai para Paris em busca de Credence (Ezra Miller) na esperança que o poder do jovem o ajude em seus planos. Sabendo da ameaça de Grindelwald, Dumbledore (Jude Law) pede a Newt que viole a proibição e tente encontrar Credence em Paris antes de Grindelwald, mas Newt reluta em tomar parte no conflito violento que se desenha.

Assim como o primeiro, o filme tem dificuldade de transitar entre um tom leve e aventuresco das interações entre Newt e suas adoráveis criaturas, para o tom sombrio da ascensão de Grindelwald e seus ideais supremacistas. Em uma cena vemos Newt usar alguma traquitana engraçadinha para capturar um monstro para logo depois vermos Grindelwald disseminando discursos de ódio com seus nazistas mágicos e falta organicidade nessas transições.

quinta-feira, 8 de novembro de 2018

Crítica – Operação Overlord


Análise Crítica – Operação Overlord


Review – Operação Overlord
Ninguém sabia muita coisa sobre Operação Overlord quando o primeiro trailer foi lançado. As prévias mostravam um filme situado na Segunda Guerra Mundial com elementos de terror e sobrenatural. Mesmo com os trailers, era algo cercado de mistério e, sinceramente, não sabia o que pensar. Assistindo o filme, porém, encontrei uma competente mistura de O Resgate do Soldado Ryan (1998) e Resident Evil (2002) com pitadas dos recentes games da franquia Wolfenstein, que vai além de sua roupagem de filme B ao construir uma metáfora sobre o custo humano (e humanístico) da guerra.

A trama é relativamente simples: às vésperas do desembarque das tropas aliadas na Normandia, um grupamento de paraquedistas tem a missão de destruir uma torre de rádio para que as tropas tenham apoio aéreo. A missão começa com problemas, o avião é abatido e boa parte da tropa é morta, deixando um pequeno número de soldados para completar a missão. Entre eles está Boyce (Jovan Adepo), que descobre que os alemães estão fazendo misteriosas experiências no complexo militar no qual a torre está localizada.

O filme consegue fazer muito em termos de construção de suspense usando muito pouco. Se situando quase todo dentro de uma casa na vila francesa controlada pelos nazistas. Ainda assim há um constante e palpável senso de urgência e temor por conta da corrida contra o tempo para terminar a missão, do fato dos personagens estarem em imensa desvantagem em relação ao inimigo e pelo mistério do que realmente está acontecendo nos laboratórios nazistas. O design de som ajuda na atmosfera de suspense, seja sugerindo a constante presença de tropas ao redor da casa em que os personagens estão escondendo, seja sugerindo toda uma extensão de horrores dos laboratórios nazistas através dos gritos das cobaias/vítimas.

quarta-feira, 7 de novembro de 2018

Crítica – Millennium: A Garota na Teia de Aranha


Análise Crítica – Millennium: A Garota na Teia de Aranha


Review – Millennium: A Garota na Teia de Aranha
Eu li toda a trilogia Millennium escrita por Stieg Larsson e também vi os filmes baseados na trilogia, tanto os três filmes suecos quanto a adaptação hollywoodiana do primeiro livro. Quando um quarto livro, A Garota na Teia de Aranha, foi anunciado em 2013, no entanto, não tive interesse em conferir, já que a nova história não seria feito pelo criador da trilogia (Larsson morreu em 2004), nem seria baseada em qualquer material ou rascunho deixado por ele, seria algo inédito feito por um novo escritor.

A escolha por recomeçar a franquia nos cinemas a partir deste quarto livro faz sentido de um ponto de vista estratégico. O segundo e o terceiro livro são praticamente uma narrativa única, então seria arriscado começar pelo segundo e deixar a história inacabada caso não fizesse sucesso (ou colocar muito dinheiro para fazer dois filmes de uma vez). O primeiro livro já tinha sido feito duas vezes, então sobrava o quarto livro, que poderia ser trabalhado para oferecer um ponto de entrada aos não iniciados, ao mesmo tempo que traria aos cinemas uma história que os fãs ainda não tinham visto em tela grande. Parecia ser o melhor dos dois mundos, mas o resultado final de Millennium: A Garota Na Teia de Aranha é algo que não parece capaz de satisfazer nenhum dos dois grupos.

terça-feira, 6 de novembro de 2018

Crítica – Killing Eve

Análise Crítica – Killing Eve


Review – Killing Eve
Fui atraído para Killing Eve pela presença da atriz Sandra Oh, famosa por viver a Christina Yang em Grey’s Anatomy, e o que encontrei foi uma competente história de espionagem. Criada por Phoebe Waller-Bridge (que interpretou a robô L3-37 em Han Solo) a partir dos romances de Luke Jennings protagonizados pela espiã Villanelle, a série é carregada de tensão e suspense conforme suas duas protagonistas caçam uma à outra.

Eve Polastri (Sandra Oh) é uma funcionária de baixo escalão da inteligência britânica. Entediada com seu cargo burocrático, ela vê a oportunidade de participar de uma operação de espionagem quando uma atividade de rotina a coloca diante de uma perigosa assassina russa. Essa assassina é Villanelle (Jodie Comer), que vive uma vida de luxo por conta de seu trabalho. Aos poucos essas duas mulheres se tornam obcecadas uma com a outra, dando início a um tenso jogo de gata e rata.

Seria fácil transformar Villanelle em uma sociopata genérica, mas tanto o roteiro quanto o trabalho da atriz Jodie Comer colocam nela tantas camadas de complexidade que a tornam uma figura magnética sempre que está em cena. A assassina tem um evidente prazer sádico em matar suas vítimas e não parece ser afetada por essa violência ou exibir qualquer grau de remorso.

segunda-feira, 5 de novembro de 2018

Crítica – House of Cards: 6ª Temporada

Análise Crítica – House of Cards: 6ª Temporada


Review – House of Cards: 6ª Temporada
A sexta e última temporada da série House of Cards teve uma produção conturbada. Dias depois do começo das gravações da temporada começaram a sair denúncias de abuso sexual cometidas pelo ator Kevin Spacey. A sofrível resposta de Spacey às acusações só piorou tudo e a Netflix (assim como outras produtoras e estúdios) inevitavelmente cortou laços com o ator.

Com a perda do protagonista, a série parou a produção para se reorganizar e decidir o que faria. Depois de alguns meses, a produção foi retomada com a decisão de Claire (Robin Wright), que tinha se tornado presidente no final da quinta temporada, seria a protagonista da temporada final e que Frank, personagem vivido por Spacey, ficaria completamente de fora. Isso deixava claro que o conflito entre Claire e Frank que vinha se desenhando desde a quarta e quinta temporadas e que deveria ser a força motriz dessa temporada climática jamais aconteceria.

sexta-feira, 2 de novembro de 2018

Crítica – O Mundo Sombrio de Sabrina


Análise Crítica – O Mundo Sombrio de Sabrina


Review – O Mundo Sombrio de Sabrina
A série O Mundo Sombrio de Sabrina faz pela famosa bruxinha adolescente o mesmo que Riverdale fez pelas histórias de Archie e seus amigos, reinventou-as sob um viés mais sombrio, ainda que mantendo seu ar de drama adolescente. Ambas séries são produzidas por Roberto Aguirre-Sacasa, responsável por reinventar esses personagens (tanto Archie quanto Sabrina) nos quadrinhos. A bruxa se sai melhor que a turma de Riverdale pela liberdade dada pela Netflix, não precisando lidar com questões de classificação indicativa que a série do Archie (visto que o canal CW é TV aberta nos EUA), permitindo que a narrativa realmente embarque em algo sombrio e violento.

Sabrina (Kiernan Shipka) é uma adolescente filha de um bruxo e uma humana que vive com as tias, Hilda (Lucy Davis) e Zelda (Miranda Otto), depois da morte dos pais. Prestes a completar dezesseis anos, ela deve passar por seu “Batismo Sombrio” para se juntar ao grupo de bruxas do qual sua família faz parte. A garota, no entanto, reluta em jurar sua lealdade ao Senhor da Trevas por não querer abrir mão de sua vida como humana e do namorado, Harvey (Ross Lynch).

quinta-feira, 1 de novembro de 2018

Crítica – Great News: 2ª Temporada

Análise Crítica – Great News: 2ª Temporada


Review – Great News: 2ª Temporada
Quando escrevi sobre a primeira temporada de Great News (bizarramente traduzido em português como Notícias em Grande), falei sobre como a série conseguia superar sua premissa banal e eventualmente encontrava uma identidade própria ao investir no absurdo. Pois longe dos problemas de personalidade do seu ano de estreia, Great News decola desde o início de sua segunda temporada.

A segunda temporada continua focada em Katie (Briga Heelan) e na relação complicada que ela tem com a mãe controladora, Carol (Andrea Martin), mas também repercute o breve envolvimento de Katie com Greg (Adam Campbell) na temporada anterior e o crescente clima entre os dois. Outra novidade na temporada é a breve participação de Tina Fey como a poderosa executiva Diana St. Tropez.

Assim como antes, a série mira seu alvo crítico nos noticiários televisivos e no modo como eles parecem mais preocupados em criar polêmicas do que efetivamente investigar e analisar os fatos. Também usa o humor para falar sobre tópicos atuais, como a questão do assédio no ambiente de trabalho no episódio em que Diana assedia os homens da redação, ou também dos limites do humor, questionando a ideia de que não faz sentido reclamar da “patrulha do politicamente correto” em um tempo no qual pessoas marcham nas ruas com símbolos nazistas. A temporada ainda faz piada com nosso apego a redes sociais e como esses meios são usados para construir um ideal falso de vida perfeita.