sexta-feira, 13 de junho de 2025

Rapsódias Revisitadas – Ed Wood

 

Crítica – Ed Wood

Análise Crítica – Ed Wood
Considerado por muito tempo como o pior diretor do mundo, os filmes de Ed Wood são lembrados por sua tosqueira, uso de imagens de arquivo e narrativas insólitas. Ele é uma figura singular no cinema dos EUA, vivendo às margens dessa indústria a despeito de seu desejo de ser parte dela. Talvez seja essa vida de pária que atraiu Tim Burton, sempre interessado em personagens solitários ou excluídos, a contar a história do diretor em Ed Wood, lançado em 1994.

Cinema nas bordas

A narrativa é toda filmada em preto e branco, acompanhando Ed (Johnny Depp) desde seus esforços para filmar seu primeiro longa-metragem, Glen or Glenda (1953), passando por sua amizade com o ator Bela Lugosi (Martin Landau), suas tentativas de se estabelecer na indústria e a culminância de sua carreira em Plan 9 From Outer Space (1959), produção que lhe deu fama, ou melhor, infâmia internacional.

Seria fácil reduzir alguém como Ed a uma figura ridícula, mas Burton entende o afeto genuíno pelo cinema que move Wood. A despeito da precariedade ou baixa qualidade de suas produções, Burton analisa como tudo que ele faz vem de um sonho bastante sincero que Wood tem em ser um grande diretor. É um movimento similar ao que James Franco e Seth Rogen fariam anos depois em Artista do Desastre (2017) sobre o igualmente infame Tommy Wiseau.

O Wood retratado por Burton é alguém que escolheu o cinema, mas que não foi escolhido por ele. Um lembrete de como a arte não é apenas sobre técnica ou sobre fazer sucesso, mas sobre dar vazão às nossas paixões e sentimentos. Esse amor que Wood tem pelo cinema é traduzido pela performance de Depp, que instila um otimismo ingênuo em Wood, algo evidenciado na cena em que ele conversa ao telefone com um executivo de estúdio que lhe diz que Glen or Glenda é o pior filme que ele já assistiu e Wood rapidamente responde animado “meu próximo será melhor” antes do executivo bater o telefone na cara dele. Mesmo os hábitos menos ortodoxos de Ed, como o fato dele gostar de se vestir de mulher embora não seja gay, nunca são observados como algo meramente aberrante e há um esforço de entender o que move esses comportamento.

Vampiro esquecido

O filme, porém, é tanto sobre Ed quanto é sobre Bela Lugosi, ator húngaro famoso na década de 1930 por interpretar Drácula. Se Ed Wood é um sujeito barrado por Hollywood, Lugosi é alguém esquecido pela indústria. Já longe de seus dias de auge, o ator vive de pequenas performances como vampiro que não são mais do que um simulacro cansado do que ele um dia fora. O veterano Martin Landau traz uma certa amargura a Lugosi, alguém que se ressente pela indústria por nunca ter tido seu valor reconhecido (talvez pelo horror ser, na época, considerado um gênero B) ou colocado de lado e relação a outros atores como Boris Karloff.

Há, no entanto, uma fragilidade em Lugosi, tanto pela sua idade avançada que torna difícil que ele acompanhe o ritmo de uma produção, como na cena em que eles vão gravar uma externa noturna, quanto por seu vício em drogas. Nesse sentido, o filme pensa como a conexão entre ele e Wood se dá por eles se reconhecem enquanto párias naquela indústria, como por eles perceberem o valor um do outro, algo evidenciado no momento em que Wood escreve um novo monólogo para Lugosi no qual o cientista louco que ele interpreta fala sobre o ressentimento de ter sido excluído. Como um idoso solitário e fragilizado, Lugosi se conecta a Wood por ele ser alguém que finalmente pode contar ou depender.

Para além de Depp e Landau, o filme conta com um competente elenco coadjuvante, como Bill Murray como excêntrico figurinista que trabalha com Wood e uma excelente, ainda que breve performance de Vincent D’Onofrio como o lendário diretor Orson Welles. Desaparecendo no personagem tanto em termos de aparência como na cadência e tom de voz particulares de Welles, D’Onofrio faz o máximo com os poucos segundos de cena que tem.

Com um olhar afetuoso sobre seu biografado, Ed Wood usa seu protagonista como uma metonímia para aqueles que amam o cinema e se engajam em sua realização independente dos resultados ou da qualidade, lembrando como arte é, a despeito de sua faceta comercial, um gesto emocional.


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