quinta-feira, 31 de março de 2022

Crítica – Nossa Bandeira é a Morte

 

Análise Crítica – Nossa Bandeira é a Morte

Review – Nossa Bandeira é a Morte
Confesso que fui pego desprevenido por Nossa Bandeira é a Morte, série de piratas produzida pela HBO Max. De início parece apenas uma paródia com os clichês de filmes de piratas, mas conforme a temporada avança, ela cava mais fundo das ideias por trás da mitologia desse tipo de narrativa e vira tudo do avesso.

A trama é centrada em Stede Bonnet (Rhys Darby) um homem que deixou para trás uma vida infeliz pelo sonho de se tornar pirada. O problema é que Bonnet, apesar de seu otimismo e boa vontade, é completamente incompetente como pirata, mal conseguindo sobreviver aos perigos dessa vida não fosse o auxílio dos excêntricos membros de sua tripulação. Eventualmente ele cruza com o temível Barba Negra (Taika Waititi), que fica intrigado porque alguém da alta sociedade como Stede viraria pirata.

Stede, por sinal, é baseado em uma pessoa real. Um dono de fazenda de Barbados que largou esposa e filhos para se tornar pirata sob a alcunha de “o pirata cavalheiro”, o Stede Bonnet real é basicamente uma nota de rodapé na história da pirataria. Seria fácil a série reduzi-lo ao ridículo (e isso é feito em muitos momentos), mas o personagem nunca se limita a isso.

A narrativa usa Stede e seu otimismo ingênuo para falar da importância de correr atrás de seus sonhos, que construir aquilo que imaginamos para nós independente de como pareça impossível. De certa forma isso se conecta com o segundo grande tema da série que é o da masculinidade tóxica. Histórias de piratas costumam idolatrar os mais brutos, os mais durões, e fazer piada com o fato de quem não se adequa a isso ser frágil ou ser menos homem.

Ao longo da temporada e durante o desenvolvimento da amizade entre Stede e Barba Negra, vamos percebendo que esse ideal de masculinidade ao qual os piratas almejam é mais uma prisão do que qualquer outra coisa. A ideia de que homens confinados em um navio por longos períodos tendem a se relacionar é tratada aqui com naturalidade e não como algo aberrante. O imediato de Barba Negra, Izzy (Com O’Neill), que costuma lançar ofensas preconceituosas e homofóbicas para a tripulação de Stede é tratado como alguém baixo e patético. Ao invés de rebaixar aqueles que são alvo de seus preconceitos, o roteiro rebaixa o próprio preconceituoso.

O arco de Barba Negra mostra como ele quer mostrar ao mundo outras facetas além de seu lado bruto e cruel, mas acaba preso à performance de masculinidade que criou para si. Toda vez que tenta se libertar acaba deixando de ser respeito e, para compensar, acaba agindo de maneira ainda mais bruta. É um ciclo vicioso de uma fuga de si mesmo que ilustra o dano que a masculinidade tóxica causa até mesmo em quem age de acordo com ela.

A série também conta com um conjunto de personagens excêntricos que compõem a tripulação de Stede e seu plantel de adversários, de Ewen Bremner como um tresloucado pirata escocês, passando pelo trabalho de Vico Ortiz como uma pirata não-binária ou Leslie Jones como uma capitã pirata polígama. A maioria deles também recebe suas próprias tramas e estas, assim como as narrativas principais, também levam a lugares inesperados.

Casando besteirol e sátira social, Nossa Bandeira é a Morte é uma divertida análise de certos ideais de masculinidade.

 

Nota: 8/10


Trailer

 

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