quarta-feira, 27 de março de 2019

Crítica – Vox Lux: O Preço da Fama


Análise Crítica – Vox Lux: O Preço da Fama


Review – Vox Lux: O Preço da Fama
Ano passado Nasce Uma Estrela contou uma história de amor que exibia um certo pessimismo e desencanto em relação ao mundo da música. Quem não era destruído por ele, como o protagonista Jackson (Bradley Cooper), arriscava perder sua identidade e se tornar mais um produto pasteurizado dessa máquina de moer gente, como a protagonista Ally (Lady Gaga). Este Vox Lux: O Preço da Fama tenta também fazer um comentário desencantando sobre o meio, o egocentrismo que o domina e como as pessoas se perdem em meio a tudo isso. A questão é que Vox Lux: O Preço da Fama parece deslumbrado demais com suas próprias afetações para ser contundente na sua crítica das afetações do meio.

A trama começa ainda na década de 90, com a protagonista, Celeste (Raffey Cassidy), ainda uma adolescente que sonha em fazer sucesso no mundo da música. Quando um atirador entra na escola de Celeste, matando vários de seus colegas e ferindo a própria, Celeste e a irmã, Eleanor (Stacy Martin), compõem uma canção sobre superar o trauma. A música chama a atenção da mídia nacional, catapultando Celeste ao estrelato. A fama leva à sua perda de inocência e a reencontramos já adulta, agora interpretada por Natalie Portman, como uma diva pop que tenta reerguer a carreira depois de vários escândalos envolvendo drogas.

É interessante perceber que o diretor Brady Cobert apenas troca a intérprete de Celeste durante essa passagem de tempo, com o resto do elenco como Eleanor ou o empresário dela (Jude Law) se mantendo o mesmo e sem qualquer tipo de esforço de maquiagem ou efeito digital que dê a impressão de que essas pessoas envelheceram. A ideia parece ser a de que Celeste mudou radicalmente enquanto o mundo ao seu redor permaneceu o mesmo. Transformada pelas engrenagens da máquina midiática e pelos anos de fama.

Por outro lado, o filme usa uma série de outros dispositivos que não rendem tanto quanto o seu uso faz parecer. Desde o início a narrativa associa a jornada de Celeste a grandes tragédias nacionais, do tiroteio massivo no início ao Onze de Setembro quando ela pega a irmã na cama com o empresário, passando por um ataque terrorista quando a reencontramos na idade adulta. A ideia parece querer associar as duas construções midiáticas, a da estrela pop e da grande tragédia nacional, como meros produtos de uma indústria cultural, feitos para serem consumidos massivamente nos meios de comunicação apenas para serem superados tempos depois por algum novo fato.

É possível também pensar na associação como uma tentativa de conectar o egocentrismo dessas grandes estrelas com os autores dessas atrocidades, que se comportam de maneira autocentrada e egoísta para ganhar notoriedade às custas de outros. A questão é que essas ideias nunca são plenamente desenvolvidas, o filme aponta isso e já se acha brilhante por ter tido esse leve insight sem levar o raciocínio adiante e sem conseguir sair da superfície dos temas.

Causa estranhamento a tentativa de colocar cenas com efeitos de granulação para dar a ideia de material antigo de arquivo acompanhadas de uma narração solene feita por Willem Dafoe. A impressão é que estamos vendo um documentário dentro do filme, como se fosse uma produção sobre a vida de Celeste, mas a existência desses segmentos nunca é plenamente justificada e a narração poderia funcionar sem que o filme precisasse dar a ideia de que estamos vendo imagens “documentais” já que ninguém vai se questionar se está diante de uma obra de ficção ou não.

A narração, embora sirva como uma necessária ponte entre elipses temporais, por vezes é cheia de longos discursos que expõem os temas de maneira excessivamente mastigada, recorrendo a metáforas batidas (como a fala de que Celeste vendeu a alma ao diabo), mas que são ditas com um grande senso de autoimportância. Na verdade, o material não consegue ir além da noção de que a fama muda e destrói as pessoas, uma noção que dez entre dez filmes que abordam os bastidores da indústria cultural abordam, fazendo muito pouco para oferecer ideias verdadeiramente contundentes sobre o fenômeno.

Quem segura mesmo o filme é Natalie Portman em uma performance claramente pensada para ser exagerada. Com um forte (e talvez até caricato) sotaque nova-iorquino, Portman faz de Celeste uma diva histriônica que pensa que o mundo gira em torno dela e não considera as necessidades de ninguém ao seu redor. É como se a atriz entendesse a farsa sórdida e fútil que é o mundo da fama (algo que o diretor Paul Verhoeven e a atriz Elizabeth Berkley fizeram no incompreendido Showgirls) e enfiasse o pé no acelerador da conduta autocentrada da personagem, que mal parece a garota sonhadora ou ingênua da primeira metade do filme. Aliás, a ideia de Celeste ser uma espécie de “monstro” criado pela indústria cultural é expressa pelo seu penteado e mecha branca no cabelo que remetem à protagonista de A Noiva do Frankenstein (1935), criando a impressão de que Celeste é essa cria maldita dos experimentos do meio musical.

Vox Lux: O Preço da Fama pode não ser tão esperto ou contundente como pensa ser, mas se sustenta pela performance intensa de Natalie Portman.

Nota: 6/10

Trailer

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