terça-feira, 10 de setembro de 2019

Crítica – Indústria Americana


Análise Crítica – Indústria Americana


Review – Indústria Americana
Produzido pela Netflix, o documentário Indústria Americana tenta retratar os conflitos causados pela chegada de uma fábrica chinesa aos Estados Unidos. Poderia render uma boa discussão sobre capitalismo, globalização e imperialismo, mas o filme acaba ficando à margem de tudo isso e o resultado é um produto superficial que parece não entender que a história que está contando é apenas uma parte de uma questão muito maior.

No filme, uma cidade no interior dos Estados Unidos teve sua economia dilapidada quando a General Motors fechou uma fábrica no local. A cidade volta a ter esperança no próprio crescimento quando um bilionário chinês compra o espaço da antiga fábrica e a reabre como uma fábrica de vidros para automóveis. A esperança, no entanto, vai se esvaindo conforme os trabalhadores vão se confrontando com o “estilo gerencial” dos chineses.

Aí começam os problemas do filme. Ele retrata toda a situação com um foco míope que faz as disputas entre patrões e empregados parecer algo particular dos chineses, cuja disciplina e foco em produtividade os faz explorar os trabalhadores ao máximo. Na verdade, essa é uma estratégia típica do capitalismo globalizado constantemente adotada por países imperialistas.

Você move sua produção do seu país para outra região do mundo no qual a economia não vai muito bem, aproveita o desespero dos trabalhadores oferecendo salários menores e menos benefícios criando um discurso que faz tudo isso parecer vantajoso para os trabalhadores explorados e assim expande sua produção ao mesmo tempo em que diminui custos. É vantajoso para os donos, mas nem tanto para os funcionários.

Ao falhar em entender o contexto maior desse tipo de prática, feita não só pela China como também por outras grandes potências, como os próprios EUA, que há décadas abrem fábricas em países subdesenvolvidos na Ásia, África e América Latina (incluindo o Brasil), o filme pinta a situação como fruto de um impulso autoritário e expansionista chinês quando a questão está longe de se relacionar com a cultura de uma nação ou povo e sim com a cultura do capitalismo.

Fazendo tudo parecer “culpa da China” o filme não só alimenta antigas noções racistas de “perigo amarelo” que eram muito difundidas nos EUA na primeira metade do século XX, como também falham miseravelmente em compreender o cerne principal da questão, deixando de desenvolver a discussão que o próprio documentário tenta empreender. Falha também em perceber como a chegada dos chineses no país é uma consequência direta do expansionismo estadunidense.

Afinal depois de décadas de empresas dos EUA fechando fábricas em seus próprios territórios para abrir em países com mão de obra mais barata, era evidente que alguma força estrangeira entraria nos Estados Unidos para preencher o vácuo e a demanda dos trabalhadores que as empresas nacionais deixaram. De certa forma, é como se finalmente os EUA tivessem recebido a “fatura” a ser paga por tantos anos de imperialismo e colonialismo. No caso específico retratado no filme isso acontece por meio da China, mas poderia se tranquilamente qualquer outra potência global como Rússia ou Alemanha, já que é o resultado de um processo histórico que se constrói há décadas e não o fruto da ação isolada de um único país.

O filme, no entanto, passa batido por todo esse contexto histórico, político, econômico e social, preferindo enquadrar tudo por um viés de “choque entre culturas”, abordando a China ou os processos de automação como os principais inimigos e não as macroestruturas de poder que orientam essas práticas. Há também uma tentativa de contar histórias pessoais de alguns dos trabalhadores, tanto chineses quanto estadunidenses, mostrando como essas culturas podem aprender uma como a outra, numa tentativa de conciliar os conflitos mostrados. O problema é que o filme nunca foca em personagens específicos, saltando rapidamente de um sujeito para o outro, nem desenha qualquer arco dramático para seus personagens, tornando difícil que criemos vínculos com eles.

Indústria Americana soa como uma oportunidade desperdiçada, tratando uma questão complexa com uma miopia que varia entre a ingenuidade e o preconceito, falhando em entender a questão que se propõe a investigar.

Nota: 4/10


Trailer

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