quarta-feira, 14 de abril de 2021

Crítica – Agente Duplo

 Análise Crítica – Agente Duplo


Este Agente Duplo é uma daquelas histórias em que a realidade se mostra tão inesperada quanto qualquer ficção. O documentário chileno dirigido por Maite Alberdi conta uma história de espionagem envolvendo idosos. Na trama, o detetive particular Romulo contrata Sergio, um senhor octagenário, para se infiltrar em um asilo de idosos e investigar se a mãe da cliente que contratou Romulo está sofrendo maus tratos no local.

Inicialmente o filme adota uma abordagem cômica conforme Romulo entrevista diferentes idosos para sua missão de espionagem e explica a natureza do trabalho e dos equipamentos (como óculos com câmera escondida) que terão de usar. Tudo soa como uma pastiche de filmes de investigação e espionagem, incluindo o fato do escritório de Romulo parecer algo saído de um antigo filme noir.

Conforme Sergio embarca em sua missão e chega ao asilo, no entanto, o filme ganha outros contornos e a personalidade afável e gentil do idoso acaba afastando-o um pouco da missão conforme ele começa a se aproximar das pessoas que moram no asilo e ouvir suas histórias. No asilo, Sergio é acompanhado por uma equipe de filmagem que está lá sob o pretexto de filmar um documentário sobre os idosos que vivem no local.

Sergio é tão carismático que não consegue evitar se tornar o centro das atenções da pacata comunidade e, com isso, vai nos mostrando diversas pequenas histórias das pessoas que vivem ali conforme o gentil protagonista tenta oferecer escuta, acolhimento e conforto às pessoas com quem conversa. Assim, conhecemos uma senhora com um alto grau de senilidade que passa um bom tempo em conversas imaginárias no telefone com a mãe que morreu, com a virgem Bertita, que se apaixona por Sergio e pensa em casar com ele, e tantas outras histórias. Na verdade, Sergio se torna tão popular que é eleito “rei” do asilo em uma das festas.

Parte desses desvios de rota vem do fato de que Sonia, o alvo de Sergio, é uma pessoa reclusa que se afasta das tentativas de aproximação do protagonista, dificultando um pouco a coleta de informações sobre o caso. Na verdade, o dispositivo da investigação acaba perdendo a importância conforme o filme progride, já que não há muito o que Sergio reportar em termos de abuso ou roubo que estejam acontecendo. Isso nos faz indagar da necessidade deste dispositivo, já que para produzir essa reflexão sobre a vida dos idosos, o filme não precisa deste recurso, bastava filmar o cotidiano das pessoas no asilo e seguir os personagens. Por outro lado, Sergio é um achado de personagem e sem o dispositivo, o filme não teria ele e perderia parte de sua força.

Além de mostrar como essas pessoas encaram a vida na idade avançada em que se encontram, o filme exibe a solidão desses idosos em asilo, muitos deles sem receber visitas de familiares, filhos e netos durante meses. É visível a dor e desamparo dessas pessoas que se sentem esquecidas pela família e entre essas pessoas está Sonia. Sergio inclusive questiona Romulo mais de uma vez a respeito da ausência da família de Sonia, que não a visita nenhuma vez nos três meses que Sergio está lá “infiltrado”.

Nesse sentido, Agente Duplo se despe de seu dispositivo inicial para se tornar uma reflexão agridoce sobre a vida em asilos de idosos carregada por um protagonista extremamente carismático.

 

Nota: 7/10


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