sexta-feira, 26 de março de 2021

Crítica – Mank

 Análise Crítica – Mank


Review – Mank
Dentro da crítica e da cinefilia há toda uma corrente de debate que argumenta que boa parte dos méritos de Cidadão Kane (1941) residiam no roteiro escrito por Herman Mankiewicz. Este Mank, dirigido por David Fincher parece tomar essa posição ao acompanhar Mank enquanto escreve o roteiro para Orson Welles.

A trama mostra Herman “Mank” Mankiewicz (Gary Oldman) acamado depois de um acidente de carro. Com problemas financeiros e de saúde que vinham desde antes do acidente e com a reputação prejudicada entre os executivos de grandes estúdios por conta de seu alcoolismo, vício em apostas e constantes críticas às hipocrisias dos magnatas da mídia, Mank aceita escrever um roteiro para o então incipiente diretor Orson Welles (Tom Burke), uma história inspirada na trajetória de William Randolph Hearst (Charles Dance).

A narrativa vai e volta no tempo entre o Mank do presente tentando finalizar seu roteiro e o passado do roteirista, mostrando sua relação complicada com o produtor Louis B. Mayer (Arliss Howard), chefão da MGM, com o ricaço Hearst e com Marion (Amanda Seyfred), a jovem esposa de Hearst. Os flashbacks mostram a relação complicada de Mank com os figurões de Hollywood e da mídia por conta de sua vida de excessos e posições políticas. Enquanto a Hollywood da década de 1930 adotava uma postura de não criticar a Alemanha nazista por medo de perder arrecadação por lá, Mank já denunciava os perigos que os nazistas representavam.

Gary Oldman é ótimo em evocar a energia caótica de Mank, um homem sem papas na língua, com opiniões sobre tudo, cheio de ideias e sem paciência para as hipocrisias dos poderosos. A questão é que o filme não vai muito além dos problemas dele com Mayer e Hearst, com cada flashback mostrando alguma discussão diferente de um dos dois.

Claro, há cenas muito significativas entre Mank e Hearst, em especial uma perto do final em que Hearst usa uma metáfora para fazer Mank entender que apesar de se considerar um pária e um opositor de pessoas como Hearst e Mayer, o roteirista não passa de mais uma engrenagem na máquina hollywoodiana que está sob controle de magnatas como o próprio Hearst. Esses momentos, no entanto, se perdem durante a longa duração do filme com outros que parecem repetir as mesmas ideias sobre o protagonista e seus desafetos. Com o tempo tudo isso acaba soando redundante, dando a impressão de algo que anda em círculos quando poderia se aprofundar mais.

Um exemplo é o retrato que é feito do processo de escrita de Mank, que se limita a traçar os paralelos entre os personagens de Cidadão Kane e as figuras reais que o inspiraram. Informações que são facilmente encontradas e conhecidas hoje. Pouco esforço é feito para entender as escolhas estruturantes em relação a natureza investigativa da trama, contada através de testemunhos de outros. Há um diálogo rápido em que Mank menciona a impossibilidade de contar toda uma biografia e o melhor a fazer seria oferecer fragmentos significativos, mas é muito pouco para dar a dimensão do quanto essas escolhas eram iconoclastas e pouco usuais dentro do cinema hollywoodiano da época.

O conflito entre Mank e Welles é outro elemento que é tratado superficialmente. A discussão sobre Mank voltar atrás da decisão de abrir mão dos créditos poderia render ponderações importantes e necessárias sobre direitos autorais ou mesmo onde está a instância autoral em uma arte que necessita tanto de coletividade quanto o cinema. A convenção é tratarmos o diretor como instância autoral, mas isso não foi uma posição que surgiu natural e instantaneamente, foi fruto de anos de debates e discussões a respeito. A questão entre Mank e Welles seria um bom ponto para provocar a cinefilia a pensar se essas ideias e suas derivações continuam se sustentando, no entanto, pouco de interessante é feito desse conflito além de posicionar Welles como mais um figurão que mastiga Mank.

Mank tem uma competente reconstrução da Hollywood da década de 1930 e se beneficia de uma interpretação enérgica de Gary Oldman, mas em muitos momentos soa como um exame redundante e superficial do processo criativo e dos conflitos de seu protagonista.

 

Nota: 6/10


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