quinta-feira, 10 de janeiro de 2019

Crítica - A Esposa


Análise Crítica - A Esposa


Review Crítica - A Esposa
É interessante como um filme com tantos diálogos tão calmos e tantos momentos de silêncio possa trazer consigo uma quantidade enorme de emoções e conflitos que vão aos poucos chegando ao ponto de ebulição. Muito disso vem do trabalho de Glenn Close, que é o centro emocional e narrativo deste A Esposa.

A trama acompanha o casal Joe (Jonathan Pryce) e Joan (Glenn Close) que viaja à Suécia para que Joe, um renomado escritor, receba o Prêmio Nobel de Literatura por conta de suas obras. Durante a viagem Joan nada mais é que um adereço acompanhando o marido, com pessoas vindo cumprimentá-lo e ignorando-a por completo e Joe muitas vezes falando em nome dela para seus interlocutores. Aos poucos vamos descobrindo que o silêncio dela durante o evento tem outras razões para o fato de ser uma esposa que viveu dedicada ao marido e existe apenas para apoiá-lo.

A trama vai mostrando como o mundo da arte é dominado por homens, seja na produção artística, na direção das editoras e curadorias, ou mesmo na crítica de arte (e ainda hoje a crítica é um espaço majoritariamente masculino). Assim, mesmo uma escritora de talento, como é o caso de Joan em sua juventude, tem dificuldade de penetrar ou ser levada à sério nesses ambientes dominados por homens em todas as posições.

Embora a narrativa se limite a mostrar como isso ocorre no campo literário, é difícil não pensar que muito do que é narrado aqui não se passa também em muitos outros campos profissionais, dificultando que mulheres capazes alcancem seu potencial e obrigando-as a se conformar ao papel social tradicionalmente aferido a elas de ser a esposa que se anula e cuida dos afazeres domésticos para apoiar as ambições do marido.

Mesmo quieta e calma durante boa parte do filme Glenn Close permite que vejamos as décadas de frustrações, sonhos abandonados e um certo ressentimento por ser vista por todos como um mero adereço do marido. Seu olhar expressa um volume imenso de informação e através dele percebemos a tempestade interior que vai ser formando em Joan conforme a premiação se aproxima. Ela não é uma mulher prestes a explodir, mas prestes a implodir, alguém que sufocou tanto os próprios desejos e vontades que parece prestes a se asfixiar caso não coloque tudo para fora.

Jonathan Pryce, por sua vez, constrói Joe como um homem inseguro, que precisa de constante validação de todos ao seu redor (seus casos extraconjugais ser mais por uma questão de ego do que desejo). Incapaz de lidar com críticas e extremamente dependente da esposa ainda que, paradoxalmente, ele a trate como alguém frágil e não o contrário, o que, mais uma vez, mostra as consequências de uma criação machista, já que ele não vê problema algum em explorar a esposa e deixá-la constantemente em segundo plano.

Apesar dessa consistente construção das estruturas de poder machistas que existem na nossa sociedade, A Esposa acaba derrapando em seu desfecho, entregando um final que resolve tudo de maneira muito fácil e sem fazer esforço para derrubar o status estabelecido. É uma pena que um trabalho que até então tinha sido tão consistentemente crítico termine de maneira tão conformista.

Isso, porém, não tira os méritos do restante do filme e sua contundente observação sobre como a sociedade se estrutura para fazer as mulheres se conformarem a um papel social específico, um ponto de vista que ganha força graças à interpretação discreta, mas cheia de nuances, de Glenn Close.


Nota: 7/10

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