quinta-feira, 20 de julho de 2023

Crítica – Oppenheimer

 

Análise Crítica – Oppenheimer

Review – Oppenheimer
É curioso que Oppenheimer, novo filme do diretor Christopher Nolan, tenha recebido tanto estardalhaço por estrear na mesma semana que Barbie por conta aparente oposição entre os dois filmes. Afinal, um era sobre uma boneca num mundo cor de rosa e outro era sobre o sujeito responsável pela bomba atômica. Na real, os dois filmes tem mais similaridade do que parece, já que ambos analisam o complicado e contraditório legado de duas figuras que estão no imaginário popular há mais de meio século.

A trama segue a trajetória do físico J. Robert Oppenheimer (Cillian Murphy), de sua juventude estudando na Europa, passando por sua participação no Projeto Manhattan que construiu a bomba atômica e os anos posteriores quando o governo dos EUA atacou sua reputação por ele se opor à proliferação de armas nucleares.

O filme se estrutura em torno de personagens depondo em dois processos. Um para cassar a liberação de segurança de Oppenheimer, como parte do projeto de prejudicar sua reputação, e outra das audiências no Senado para a confirmação de Lewis Strauss (Robert Downey Jr.) como ministro, no qual ele é perguntado de sua relação com Oppenheimer. É um arranjo que lembra A Rede Social (2010), com o protagonista depondo em diferentes processos, indo e voltando no tempo, enquanto narra a história.

O filme peca por diálogos expositivos (um problema comum na filmografia do Nolan) nos quais os personagens mais dizem como se sentem do que efetivamente demonstram isso. Claro há um componente científico complicado que precisa ser explicado, mas esse didatismo vaza para outros aspectos do filme. A narrativa por vezes parece mais interessada na bomba em si e nos meandros de sua fabricação do que em Oppenheimer e sua jornada emocional. O segmento que detalha o primeiro teste nuclear se alonga tanto que até o dispositivo narrativo dos dois testemunhos em tempos diferentes é deixado de lado.

O início demora para engrenar, mostrando os estudos de Oppenheimer pela Europa, mas explorando pouco a solidão e frustração do personagem e boa parte dos elementos apresentados aqui acaba tendo pouca repercussão no restante do filme. Talvez fosse melhor começar com Oppenheimer já em Berkeley. A impressão é que o filme deveria ter expandido mais alguns elementos e virar uma minissérie ou ter suprimido algumas coisas e focado em um recorte mais específico e consistente.

Por outro lado, o filme mostra as inquietações e ansiedades do protagonista através da montagem, usando cortes rápidos para inserir imagens de linhas de energia, colisões de átomos e outros conceitos que povoam (e assombram) a mente do protagonista. A música também é responsável pelo sentimento e tensão e pesar subjacentes à jornada do cientista, com o som sendo igualmente eficiente em nos fazer sentir a força da primeira explosão nuclear.

Cillian Murphy ilustra bem o pesar que abate Oppenheimer uma vez que sua invenção não é usada para acabar todas as guerras como ele imaginava, mas para iniciar formas ainda mais destrutivas de guerra. Murphy faz de Oppenheimer um sujeito cheio de contradições, mas cujas guinadas de opinião nunca soam gratuitas e são bem calcadas na psicologia do personagem. Quem se sai igualmente bem é Robert Downey Jr. como Strauss, que o clímax revela como sendo o responsável pela sabotagem à imagem de Oppenheimer. Downey é um burocrata que vende a imagem de sujeito que valoriza a ciência e o conhecimento, mas na verdade só se interessa pelo que a ciência pode servir seus interesses e o ator constrói bem a fachada polida que se desfaz ao final quando seus esquemas são revelados e ele deixa aparecer toda a sua mesquinhez virulenta.

Florence Pugh e Emily Blunt interpretam a amante e a esposa de Oppenheimer respectivamente e recebem o tratamento típico que essas biografias dão a personagens femininas. São personagens que existem para gravitar em torno de um homem e para não soarem completamente passivas ou desprovidas de agenciamento recebem uma ou duas cenas sendo assertivas. Sim, Blunt faz valer as cenas em que o filme exige mais dela, em especial a do testemunho, mas não afasta a impressão de que ambas são subaproveitadas.

O texto transita com maturidade em relação ao legado complicado de Oppenheimer, entendendo a urgência e a motivação que o levaram a liderar o esforço pela bomba atômica sem deixar de reconhecer os horrores que isso liberou no mundo. Para o bem e para o mal, as ações de Oppenheimer mudaram o mundo para sempre. Tal como o cientista que retrata Oppenheimer tem seus méritos e problemas, mas apresenta um saldo positivo pelo modo como expõe os impactos que seu protagonista deixou na história e o debate complexo em torno de sua figura.

 

Nota: 8/10


Trailer

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