quarta-feira, 26 de janeiro de 2022

Crítica – A Lenda do Cavaleiro Verde

 Análise Crítica – A Lenda do Cavaleiro Verde


Review – A Lenda do Cavaleiro Verde
Baseado em um poema épico que remete aos mitos arturianos e que tratava sobre virtude, este A Lenda do Cavaleiro Verde revisa o material original conseguindo tocar em temas semelhantes. O diretor David Lowery já tinha produzido meditações sobre a existência humana no excelente Sombras da Vida (2017) e aqui remete à lendas de outrora para ponderar a humanidade que há por trás dos mitos.

Na trama, Gawain (Dev Patel) é um jovem que sonha em se tornar cavaleiro. Durante as comemorações de Natal a corte é visitada pelo estranho Cavaleiro Verde (Ralph Ineson) que propõe um desafio: um cavaleiro deveria tentar atacá-lo, se conseguisse dentro de um ano o Cavaleiro Verde retribuiria o golpe com a mesma intensidade. Gawain rapidamente corta a cabeça do desafiante, imaginando ter vencido, mas o Cavaleiro Verde se levanta e avisa que estará esperando por ele dentro de um ano. Agora Gawain precisa viajar rumo ao seu destino.

O arco de Gawain é quase uma inversão da típica jornada de herói. Ao invés de provar sua virtude e atributos que o elevem acima das pessoas comuns, a cada passo esse pretenso herói mostra suas falhas e, com isso, revela que por trás das lendas há um indivíduo terrivelmente humano. Ele se mostra medroso, materialista e até desonesto, rompendo um acordo que fez com um nobre que lhe dera abrigo. Sua jornada é a de aceitar a sua fragilidade e compreender que a finitude humana é inescapável.

Nesse sentido, o Cavaleiro Verde pode ser também entendido como uma metáfora para a própria natureza. Por mais que o ser humano creia ser capaz de triunfar sobre a natureza, capaz de controlá-la ou barganhar com ela, a verdade é que a humanidade não tem domínio algum sobre a ordem natural das coisas e a natureza fará seu trabalho independente do quanto a humanidade tente fugir das consequências.

Existem, claro, outras leituras possíveis para a trama enigmática que Lowery constrói aqui, já que muitos elementos ficam em aberto possibilitando outras interpretações e daí reside também parte de sua força. Sem o cuidado devido tudo poderia soar vago ou mal amarrado, mas o diretor e roteirista tece uma trama que se insinua para nós com seus mistérios, envolve com suas imagens que são simultaneamente deslumbrantes e sinistras, apresenta elementos que nos desafiam a entendê-los ao mesmo tempo em que lhes reserva algo de inescrutável.

Boa parte dessa atmosfera de fascínio e mistério vem da estética, com cores e luzes intensas, criaturas estranhas e eventos sobrenaturais que se escondem sob uma aparência mundana. Há sempre algo imaginativo em cena para captar nossa atenção, nos atrair para o universo estranho concebido por Lowery, cujas imagens são capazes por si só de contarem uma história, algo evidenciado por uma longa sequência sem diálogos perto do final.

Assim, A Lenda do Cavaleiro Verde é uma eficiente desconstrução da jornada do herói, usando essa estrutura para meditar sobre a natureza humana e nossa relação com o mundo.

 

Nota: 8/10


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