quarta-feira, 28 de abril de 2021

Crítica – Falcão e o Soldado Invernal (Parte 2)

 Análise Crítica – Falcão e o Soldado Invernal (Parte 2)

Review – Falcão e o Soldado Invernal (Parte 2)
A série Falcão e o Soldado Invernal me surpreendeu por ampliar nosso entendimento sobre o universo Marvel, em especial o estado do mundo após o estalo de Thanos ser desfeito, e também como o roteiro trabalha questões relativas à identidade nacional dos Estados Unidos. Ao longo da temporada os episódios analisam as contradições e injustiças do projeto de nação dos EUA, expondo as fragilidades do discurso do país sobre liberdade e justiça. Muito dessa discussão se dá no arco de Sam e seu percurso para aceitar o escudo do Capitão América, mas os antagonistas da série também desempenham um papel importante e é sobre eles que falaremos nessa segunda parte.

Os antagonistas

A série também acerta no seu tratamento aos antagonistas, evitando maniqueísmos simplórios e tratando esses personagens como figuras complexas. Seria fácil tornar John Walker um babaca sem qualquer aspecto positivo, afinal ele é o sujeito que recebeu o escudo do Capitão América de mão beijada, sem ter feito por merecer. Ainda assim, a série escolhe que o primeiro grande contato que temos com Walker seja em um vestiário, nervoso por assumir o posto de Capitão, sobrepujado pela pressão de existir à sombra de Steve Rogers. O vemos como um sujeito vulnerável e instável, que até quer fazer a coisa certa, mas não tem a temperança e a empatia de Steve. Wyatt Russell, por sinal, é ótimo em construir a personalidade arrogante e impertinente de Walker, fazendo dele o tipo de adversário que dá gosto de odiar.

A presença de Walker aqui também mostra que Steve estava correto em Capitão América: Guerra Civil (2016) ao temer o que poderia acontecer com um Capitão América controlado pelo governo. Walker é um instrumento agressivo do imperialismo estadunidense, agindo como bem entende em nome de uma missão que considera justa sem parar por um segundo para questionar a moralidade de seus atos, automaticamente se considerando do lado certo.

Se Steve representava os ideais que os EUA almejam alcançar, Walker representa o que os EUA de fato projetam para o mundo, truculência, opressão e violência. Por isso a imagem do escudo manchado de sangue depois de Walker brutalmente matar um dos Apátridas é uma imagem tão impactante, simboliza uma mácula ao legado de Steve e também o fato dos EUA serem uma nação que projeta força às custas do sangue dos outros. Nesse sentido, Walker tem razão ao apontar a hipocrisia dos governantes ao dizer que apenas fez o que pediram que ele fizesse. A fala, dita na audiência que o destitui como Capitão explicita como os Estados Unidos querem projetar ao mundo a imagem de que são tolerantes e responsáveis quando na verdade se comportam como se o mundo fosse o playground deles e podem fazer o que bem entendem.

Daniel Bruhl tem um ótimo retorno como Zemo, tornando ainda mais crível a motivação do personagem em querer exterminar seres aprimorados. É difícil não dar razão a Zemo quando ele diz que o desejo de querer ter habilidades aprimoradas está conectado ao desejo de querer se elevar acima da humanidade e agir como um deus. Watchmen (2019) trouxe um ponto de vista similar ao explorar como a iconografia dos super-heróis está conectada a uma visão de supremacia branca. Bruhl também acerta na natureza ardilosa de Zemo, que demonstra sempre estar no controle da situação, manipulando os heróis e eventos ao seu favor sem precisar recorrer aos planos excessivamente mirabolantes de Capitão América: Guerra Civil (2016). O ator ainda traz um considerável carisma a Zemo, que é revelado como um nobre Barão assim como sua versão dos quadrinhos, protagonizando alguns momentos divertidos como sua cena de dança em Madripoor.

Já Karli, a líder dos Apátridas, é construída como alguém como um desejo legítimo de melhorar as vidas das pessoas ao seu redor e aos poucos vai adotando métodos cada vez mais radicais por achar que meios pacíficos não são suficiente para chamar a atenção dos poderosos. O problema do arco de Karli é que toda essa situação dos refugiados não é devidamente construída pela trama. Diálogos nos informam da ingerência e lentidão do órgão internacional responsável por lidar com as pessoas que voltaram depois que o estalo, mas nunca vemos concretamente um exemplo disso ou quais são as situações que acontecem com esses refugiados. Assim, a jornada da personagem não tem o impacto que deveria.

Outro personagem que é construído com certa ambiguidade moral é Sharon Carter (Emily VanCamp), que retorna depois de ter sido esquecida pela Marvel desde Guerra Civil. Sharon está bem diferente, tendo se tornado uma mercenária na ilha de Madripoor depois de ser considerada traidora ao ajudar, Steve, Sam e Bucky. É compreensível que essa experiência a tenha tornado cínica e amarga, mas ainda assim é difícil comprar a guinada que a personagem dá ao ser revelada como a Mercadora do Poder, a misteriosa figura que controlava Madripoor e estava por trás do soro tomado pelos Apátridas. A revelação não é devidamente construída, já que por mais que tenha se tornado uma pessoa desiludida, Sharon era alguém dotada de um senso de justiça e moralidade dignos de Steve, então por mais que ela tenha passado a agir na ilegalidade (como o próprio Steve ficou um tempo) é difícil crer que alguém como ela simplesmente tenha decidido dar armas e superpoderes a criminosos apenas para ganhar dinheiro.

Fiquem ligados na terceira parte, que será focada no desfecho da temporada.

Confiram aqui as outras partes da crítica

Parte 1

Parte 3

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