sábado, 19 de maio de 2018

Crítica - 13 Reasons Why: 2ª Temporada


Análise Crítica - 13 Reasons Why: 2ª Temporada


Review - 13 Reasons Why: 2ª Temporada
Quando escrevi sobre a primeira temporada de 13 Reasons Why falei que apesar de ficar curioso sobre a resolução de algumas pontas soltas, em especial o processo contra a escola e as denúncias de estupro contra Bryce (Justin Prentice), não considerava que a série tinha material para sustentar uma segunda temporada. Sugeri que talvez tivesse sido melhor que a temporada tivesse dois ou três episódios a mais para resolver isso do que mais uma temporada com outros treze episódios ou que ela tivesse permanecido do jeito que estava, ficando como uma minissérie. Depois de ver essa segunda temporada, fico triste em perceber que meu diagnóstico estava correto e o resultado é um segundo ano inchado, arrastado, redundante e apologético. A partir desse ponto o texto contém SPOILERS.

A trama começa meses depois da temporada anterior com o início do julgamento do processo da mãe (Kate Walsh) de Hannah (Katherine Langford) contra a escola. A acusação quer mostrar como a escola foi negligente no tratamento do bulliyng enquanto que a defesa tenta pintar Hannah como uma garota irresponsável e namoradeira que sofreu as consequências das próprias ações. Ao mesmo tempo, Clay (Dylan Minette, que este ano protagonizou o horrendo Vende-se Esta Casa) precisa lidar com o trauma ainda presente da morte de Hannah e com a descoberta de que Bryce possivelmente estuprou mais garotas além de Hannah e Jessica (Alisha Boe).

Essa temporada adota a mesma estrutura que a anterior, com treze episódios e cada um deles focado em um personagem específico, mas desde o primeiro episódio fica evidente que a reprodução do formato é mais um grilhão do que uma necessidade. Boa parte dos eventos gira em torno dos testemunhos dos personagens no processo contra a escola e estes testemunhos se desdobram em longos flashbacks que mostram o passado desses personagens e da própria Hannah. O problema é que muitos flashbacks não trazem nenhuma informação nova repetindo coisas que já sabíamos e mesmo quando um deles traz um evento até então não mostrado, nenhum desses eventos é significativo o suficiente para mudar ou aprofundar nossa percepção sobre os personagens ou o que aconteceu com Hannah.

Um episódio inteiro dedicado aos flashbacks de Clay sobre o dia que ele usou drogas com Hannah não diz nada que já não sabíamos sobre esses personagens, do mesmo modo que ver a infância sofrida de Justin (Brandon Flynn) não aprofunda em nada sua personalidade atormentada, já que desde a temporada de estreia sabíamos de sua vida de pobreza e do fato que a amizade dele com o rico Bryce significava para Justin uma bem-vinda fuga do seu cotidiano tacanho. A primeira temporada já tinha exibido de maneira contundente (talvez até demais, considerando a controvérsia que cercou o lançamento da série) as variáveis que envolveram o suicídio de Hannah, tentar construir intriga ou dúvida ao longo do julgamento sobre eventos tão bem sedimentados soa como um dispositivo artificial para forçar intriga onde não hã nenhuma.

Outra questão são as tentativas do roteiro em responder às críticas feitas em relação a vários elementos da temporada anterior, como a representação do suicídio de Hannah ou a decisão da personagem em gravar fitas explicando suas razões para tirar a própria vida. Eu entendo que os realizadores queiram deixar claras as suas intenções e evitar equívocos interpretativos perigosos, mas o modo como isso é feito aqui é excessivamente didático e artificial. A todo momento pipocam diálogos que explicam mastigadinho vários elementos da trama da temporada anterior, como quando a "Hannah imaginária" que assombra Clay diz com todas as letras e sem qualquer sutileza que as fitas não foram gravadas como uma forma de vingança, algo que já era possível depreender na primeira temporada, mas que aqui é explicitado como se estivéssemos assistindo uma videoaula sobre a série e não a série em si.

Ocasionalmente a narrativa consegue encontrar momentos eficientes de drama quando confronta os personagens com os eventos da temporada anterior. Um exemplo é a cena em que a mãe de Hannah encontra o vestido cheio de sangue que vestia quando encontrou o corpo da filha ou nas sessões de fisioterapia de Alex (Miles Heizer), que tenta se recuperar dos danos de sua fracassada tentativa de suicídio, ao lado de Zach (Ross Butler). Nesses momentos "menores", longe de toda a tentativa de criar um jogo de intrigas no tribunal, é que a narrativa demonstra o cuidado que tem com seus personagens e suas jornadas, mas eventos muito pontuais em uma trama desnecessariamente inchada.

A temporada só ganha fôlego a partir do oitavo episódio quando as fitas de Hannah se tornam públicas e as atenções da narrativa se volta para as denúncias de estupro contra Bryce. A partir daí a série ganha força ao explorar toda a rede de impunidade que se forma ao redor de um homem acusado de estupro (principalmente alguém tão rico como Bryce), imediatamente questionando o caráter das vítimas e relativizando a questão do consentimento. Também vemos o quanto é doloroso para as vítimas falarem em público de suas experiências (principalmente quando são elas e não o estuprador o alvo do escárnio público) e de superar esses acontecimentos para tocar suas vidas para frente. O componente da intriga também funciona melhor nessa segunda metade, com os personagens correndo contra o tempo para encontrar provas materiais capazes de incriminar o estuprador, enquanto os aliados dele fazem tudo para esconder evidências e intimidar testemunhas.

Na verdade, os flashbacks de Bryce são únicos da temporada que de fato tem algo novo e relevante a acrescentar para a trama ao revelar que Bryce tentou se envolver romanticamente com Hannah durante as férias, mas fora rejeitado por ela. Essa informação serve a dois propósitos. Ela consegue trazer certa medida de complexidade a Bryce ao mostrar ele confidenciando suas inseguranças em relação aos pais para Hannah, mas ao mesmo tempo ressalta a crueldade dele ao estuprar Hannah deixando evidente que ele cometeu o ato por não aceitar a rejeição dela e não por algum tipo de "mal entendido" como ele próprio alega. Assim, a série evita torná-lo uma caricatura unidimensional, mostrando-o como um ser humano com sentimentos e vulnerabilidades, sem em momento algum relativizar ou atenuar os crimes hediondos por ele cometidos.

Em meio a tudo isso há o arco envolvendo o deslocado Tyler (Devin Druid). Solitário e com poucas habilidades de socialização, Tyler tenta se conectar com novos amigos, apenas para tudo dar errado e ele se voltar a se ver sozinho. Desde a primeira vez que o vi atirando na mata imaginei para onde a série levaria o personagem (um caminho que ficou ainda mais evidente quando ele conscientemente mata um corvo) e me perguntei se mais uma representação gráfica de violência teria realmente algo a acrescentar ao argumento da série sobre bullying e falta de alteridade. Felizmente a questão é resolvida sem recorrer a imagens chocantes, mas ainda assim alcançando um impacto emocional convincente.

A série deixa o gancho para mais uma temporada, mas, de novo, não sei se isso seria necessário. Imagino que os realizadores queiram discutir a questão da violência com armas de fogo nas escolas, uma discussão necessária, mas que não tenho certeza se a série tem fôlego para fazer. Essa temporada já conseguiu apresentar de modo consistente os motivos que levaram Tyler àquele extremo e, tirando uma explicação sobre como ele conseguiu tantas armas apesar de ser menor de idade, não há muito mais a ser explorado a respeito. Não imagino que exista aqui material suficiente para sustentar mais treze episódios, de quase uma hora cada, sem cair nos mesmos problemas vistos nesta temporada. Aliás, a questão da procedência das armas já poderia ter sido trabalhada aqui se a trama não se ocupasse tanto em repetir ideias, informações e eventos que já conhecíamos.

A segunda temporada de 13 Reasons Why tem sua parcela de bons momentos, em especial na sua segunda metade, e continua a trazer uma discussão necessária sobre saúde mental, mas faz pouco para ser capaz de justificar sua própria existência graças a uma trama com problemas de ritmo, cheia de redundâncias e excessos.


Nota: 6/10

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