quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Crítica - How To Get Away With Murder 1ª Temporada


Análise How To Get Away With Murder 1ª Temporada

Review How To Get Away With Murder 1ª Temporada
Quatro jovens se encontram na escuridão e discutem o que fazer com a arma do crime e o assassinato, corte abrupto para três meses antes e vemos os quatro chegando para a primeira aula de direito criminal na faculdade na qual são recebidos por uma rígida professora que também é advogada de defesa que se refere a sua disciplina como "Como sair livre de um assassinato". Teriam os jovens matado alguém em algum jogo doentio com essa professora? Seria a professora a vítima? O que aconteceu nesses três meses? Com apenas pouco mais de dez minutos em seu episódio piloto a série How To Get Away With Murder já nos fisgou com um instigante mistério e pelo menos uma personagem marcante na figura da professora Annalise Keating (Viola Davis), dois méritos que irá conseguir manter com consistência ao longo dos quinze episódios de sua primeira temporada.

Demorei um pouco para começar a assistir essa série apesar de bastante recomendada, o que por um lado é uma pena, pois estive perdendo uma ótima narrativa, por outro lado não precisei esperar em agonia semana a semana por um novo episódio e acabei devorando toda a temporada em dois dias. Tentarei evitar spoilers ao máximo, mas imagino que algumas pequenas menções a eventos específicos são inevitáveis, então se spoilers realmente incomodam, melhor voltar aqui apenas depois de ver a temporada inteira.

Parte drama jurídico, parte narrativa policial, essa primeira temporada é centrada na professora e advogada de defesa Annalise Keating e seu grupo de estagiários Wes (Alfred Enoch), Connor (Jack Falahee), Michaela (Aja Naomi King), Laurel (Karla Souza), justamente os quatro que vimos na cena que abre o piloto, e Asher (Matt McGorry). A narrativa alterna entre o passado, no qual eles trabalham para defender clientes que nem sempre são inocentes, e o "presente" mostrado no início do piloto com os quatro estudantes tentando ocultar o assassinato que acabaram de cometer.

Uma das primeiras coisas que chamam atenção na série é o seu ritmo, não apenas dentro de cada episódio como também no conjunto da temporada. Os episódios conseguem encontrar um raro equilíbrio entre o "caso da semana" e o arco maior da temporada. Cada episódio sempre acrescenta uma nova informação que adiciona mais intrigas a essa trama principal e cada vez que cremos ter domínio dos fatos, somos constantemente surpreendidos com novas revelações que tornam tudo incerto novamente, conseguindo nos manter sempre em suspense sem nunca parecer estar apenas enchendo linguiça ou retardando o fluxo da trama. Algumas coincidências incomodam um pouco, mas não chegam a estragar a experiência.

Os "casos da semana" trazem tramas interessantes que debatem ideias de ética, moral, legalidade, racismo, machismo e outras questões complexas que são tratadas com o cuidado que merecem, raramente recorrendo a soluções fáceis ou maniqueístas. A moralidade não é algo preto e branco aqui e culpa ou inocência são vistas mais como construtos retóricos do que conceitos objetivos e inquestionáveis. Os roteiros reconhecem que evidências, provas e objetos não representam por si só a realidade e carecem de alguma fabulação para serem imbuídas de valor comprobatório, assim, como Annalise costuma dizer, tudo se resume a quem conta uma história mais convincente.

Não significa, no entanto, que a advogada é uma mulher cínica e desprovida de princípios, na verdade ela defende com tanto clientes inocentes tanto quanto aqueles que são culpados. Na verdade, ela possui um senso de justiça bastante particular e não permite que ninguém se coloque entre ela e aquilo que crê ser correto, um exemplo é o episódio na qual ela recorre à pena de morte de um antigo cliente e não pensa duas vezes em intimar um poderoso político (que pode ser o verdadeiro culpado) como testemunha e não exibe nenhum pudor ao quebrar o decoro e tratá-lo de forma hostil. A advogada é uma personagem bastante complexa e cheia de camadas e, como qualquer ser humano, de contradições. Ela é durona, mas também capaz de ternura, sob sua aparência confiante esconde inseguranças e traumas, além de uma relação complicada com a mãe e o marido.

Há um pouco do velho clichê da mulher poderosa e bem sucedida, mas com uma vida pessoal caótica, mas a performance impecável de Viola Davis nos faz esquecer esse lugar comum ao construir com cuidado cada uma das nuances de sua personalidade, criando uma pessoa verdadeiramente multifacetada e que tem muitas razões para ser como é. Aliás, um dos momentos mais poderosos da temporada é quando ela confronta a mãe (Cicely Tyson) sobre seu passado e numa cena posterior a mãe placidamente lhe conta a verdade brutal sobre o incêndio na casa delas enquanto penteia os cabelos da filha.

Além de Davis, os estudantes também tem suas próprias subtramas, que servem para desenvolver mais suas personalidades e conflitos, nenhum deles chega a ser tão interessante quanto Annalise, mas ainda assim são suficientemente bem escritos e interpretados para não nos fazer perder o interesse. Entre esses o destaque fica por conta de Alfred Enoch (que certamente será reconhecido pelos fãs de Harry Potter), cujo Wes começa como um jovem ingênuo e bem intencionado, mas vai aprendendo a lidar com o jogo de intrigas, dissimulações e o ambiente ultra competitivo criado pela professora. Chama atenção também a atriz Katie Findlay (a Rosie de The Killing) como a dissimulada Rebecca, que aparece mais a frente na temporada, uma personagem cuja capacidade de manipulação nos deixa constantemente em estado de dúvida.

O elo fraco possivelmente é o personagem Asher, que nunca vai além do típico babaca egocêntrico e endinheirado, muitas vezes funcionando como mero alívio cômico, mas nunca se desenvolvendo como os outros colegas. Tudo bem que ele até tem seu momento no episódio em que confronta o pai sobre um ato de corrupção cometido no passado, mas tirando isso ele tem pouco a fazer, principalmente por estar tão deslocado da trama principal. Além disso, incomoda um pouco o excesso de idas e vindas de casais, algo bastante comum nas séries da produtora Shonda Rhimes (vide Grey's Anatomy), mas que acaba soando excessivo, em especial o ioiô entre Laurel e Frank (Charlie Weber).

Apesar disso, How To Get Away With Murder traz uma primeira temporada instigante e carregada de suspense, com um ritmo intenso que mantêm a trama sempre caminhando e  nos surpreendendo, além de uma poderosa interpretação de Viola Davis.

Nota: 8/10

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