quinta-feira, 15 de fevereiro de 2024

Crítica – O Menino e a Garça

 

Análise Crítica – O Menino e a Garça

Review – O Menino e a Garça
Divulgado como o último filme do venerável Hayao Miyazaki, O Menino e a Garça foi lançado nos cinemas japoneses sem qualquer trailer, apenas com um pôster para dar alguma noção do que seria. Até o lançamento no ocidente saíram alguns trailers, mas preferi assisti-lo sem ver nada, aberto a qualquer coisa que Miyazaki colocasse diante de mim e sem saber o que esperar.

A trama se passa no Japão da década de 1940 e acompanha Mahito, um garoto que perde a mãe em um bombardeio em sua vila durante a Segunda Guerra Mundial. Ele é então mandado para morar com o pai e sua nova esposa, que está grávida. Mahito tem dificuldade de se adaptar a essa nova vida e as coisas começam a ficar estranhas quando uma garça que habita o lago da propriedade começa a falar com ele e chamá-lo para uma torre em ruínas próxima que é alvo de lendas dos moradores locais. Ao entrar na torre Mahito é levado para um estranho universo paralelo e agora precisa sobreviver às ameaças e voltar para casa.

O mundo paralelo no qual Mahito se encontra é mais um espaço visualmente instigante como muito do cinema de Miyazaki. Os espíritos que voam pelos céus, os periquitos gigantes que formam um exército próprio ou o visual da estranha garça humanoide que acompanha Mahito em sua viagem. É um universo onírico que caminha entre a fofura e o sombrio, transitando com muita naturalidade entre as duas coisas. Tal como em seus filmes anteriores, a exemplo de A Viagem de Chihiro (2001), a cada novo ambiente ou situação ficamos nos perguntando como Miyazaki conseguiu imaginar aquilo, nos encantando com sua capacidade de fabulação singular.

Esse mundo de sonhos e pesadelos não existe, no entanto, apenas para nosso deleite visual. A trama funciona como uma alegoria para a jornada de Mahito em lidar com o luto da perda da mãe, processar a violência de guerra que presenciou e aceitar a madrasta em sua vida. É uma história de perda de inocência, tanto pela morte da mãe quanto por presenciar os horrores da guerra, de entender que a humanidade (e ele próprio) carrega em si um enorme potencial destrutivo, mas também é capaz de uma bondade que ilumina o mundo.

Há um sentimento agridoce de fim da infância, de que certa magia da infância está se esvaindo da vida do protagonista e não há como ele voltar a sua inocência infantil depois do que passou. Ainda assim, o filme guarda consigo um sentimento de esperança pelo que virá a seguir. Uma esperança pontuada pelos laços de afeto construídos por Mahito e como são os amigos e aliados que nos ajudam a resistir a tempos difíceis. Claro, o filme é aberto o suficiente para se abrir a diferentes interpretações e o que analiso aqui não tem qualquer pretensão de encerrar as possibilidades interpretativas que Miyazaki tenta apresentar

Nem sempre esses elementos são consistentemente amarrados e o filme parece às vezes deixar seus personagens vaguearem por suas paisagens sem muita clareza do que quer deles. Não chega a ser um problema tão grave considerando o quão envolvente esse universo é, mas fica a impressão de que tudo poderia ser melhor amarrado.

Ainda assim, O Menino e a Garça é uma ótima despedida de Miyazaki (se for de fato seu último filme) entregando uma jornada repleta de encantamento, misturando realidade e sonho para refletir sobre luto e amadurecimento.

 

Nota: 8/10


Trailer


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