Crítica – Tico e Teco: Defensores da Lei

 

Eu adorava a série animada Tico e Teco: Defensores da Lei, chegava a ter vários episódios gravados em VHS que assistia repetidamente quando era criança. A ideia de um reboot através de um longa-metragem para o Disney+ me deixava curioso, mas também preocupado. Afinal, podia ser só mais um na tendência de nostalgia rasteira e caça-níqueis que Hollywood vem explorando. Felizmente o resultado é inesperadamente autoconsciente do estado da própria indústria e seu lugar nela, bem como é a continuação de Uma Cilada Para Roger Rabbit (1988) que provavelmente nunca teremos.

A trama se passa em um universo no qual desenhos vivem entre humanos (daí minha referência a Roger Rabbit), com Tico (voz de John Mulaney) e Teco (voz de Andy Samberg) sendo amigos de infância que juntos fizeram a série de tv Tico e Teco: Defensores da Lei na década de 1990. Nos dias atuais Tico trabalha como vendedor de seguros, enquanto Teco tenta desesperadamente relançar sua carreira, tendo inclusive mudado seu visual para o de uma animação computadorizada. Quando amigos em comum da dupla começam a desaparecer, Tico e Teco se reúnem para investigar o mistério.

É uma trama que reflete sobre a natureza implacável da indústria, que lança uma propriedade intelectual depois da outra, indiferente ao que acontece com elas depois e plenamente disposta a ressuscitar e mutilar essas propriedades em um eventual reboot se isso for dar dinheiro. Que o vilão do filme, o misterioso Sweet Pete (voz de Will Arnett), no final se transforme em uma espécie de ser monstruoso formado de partes de vários desenhos diferentes mostra a colcha de retalhos que virou Hollywood, criando “multiversos” e outras desculpas narrativas para forçar bricolagens de vários elementos familiares e atrair a atenção do espectador (como o último Space Jam).

Claro, o filme é inteligente o suficiente para entender que é parte dessa engrenagem e, por conta disso, também não se leva completamente à sério, preferindo um tom mais cômico e caótico similar ao que os últimos Anjos da Lei fizeram, exibindo um humor autoconsciente de toda essa onda de reeboots. O universo criado, por sinal, mistura vários tipos de personagens animados, como 2D, 3D, stop motion e até fantoches.

Algumas piadas até fazem graça em cima de algumas tendências que não deram certo, como as animações ultra realistas do início dos anos 2000, cujos visuais eram mais perturbadores do que impressionantes, tipo O Expresso Polar (2004) e Beowulf  (2007). Falando em feio, não poderia deixar de mencionar uma das maiores surpresas e um dos elementos mais engraçados do filme que é a presença do “Sonic feio”, o design original do filme do Sonic aparece aqui como uma subcelebridade fracassada e rende alguns dos momentos mais divertidos.

Há também uma tentativa de construir um arco mais emocional em torno da amizade de Tico e Teco, focando a reparação desse relacionamento que terminou em mágoas para ambos quando encontramos eles no começo do filme. Embora as vozes de Mulaney e Samberg consigam dar conta dos sentimentos complicados dos dois, o desenvolvimento da reparação deles não chega a ter o impacto emocional necessário.

Ainda assim, considerando a onda de reboots caça-níqueis em Hollywood, Tico e Teco: Defensores da Lei surpreende ao ser bem melhor do que teria qualquer direito de ser, com um senso de humor caótico que debocha do universo das animações e do estado atual da indústria do entretenimento.

 

Nota: 8/10

 

Trailer