quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Crítica – O Conselheiro do Crime

Diferente do que o título nacional parece sugerir, o protagonista deste O Conselheiro do Crime não é um sujeito calejado nos meandros do crime organizado como o Tom Hagen (Robert Duvall) de O Poderoso Chefão(1972), tampouco é um escroque safado e escorregadio como o Saul Goodman da série Breaking Bad. Na verdade, é apenas um sujeito com pouca familiaridade com o crime e que vê no tráfico um modo de ganhar dinheiro fácil.
A trama,  escrita por Cormac McCarthy, guarda algumas semelhanças com outro trabalho baseado numa obra do escritor, o vencedor do Oscar de melhor filme Onde os Fracos Não Têm Vez (2008). Assim como no filme dos irmãos Coen vemos um sujeito envolvido em uma situação que não compreende com exatidão, mas ainda assim se julga mais esperto capaz de resolvê-la e acaba pagando um alto preço pela própria ignorância, sendo devorado em uma brutal espiral de crueldade e violência. O advogado interpretado por Michael Fassbender defende pequenos criminosos, mas não tem por si grande vivência ou experiência no mundo do crime, ele tenta faturar um dinheiro a mais investindo em uma operação de tráfico internacional que envolve o transporte de drogas pela fronteira do México e quando tudo dá terrivelmente errado, se vê sob a mira implacável dos cartéis mexicanos.

O personagem, por sinal, jamais tem seu nome revelado e essa falta de identidade permeia sua vida, desde as roupas claras e impessoais, passando pelo apartamento ascético e branco, cuja decoração nunca apresenta nenhuma característica digna de nota que nos ajude perceber qualquer componente de psique, como se ele fosse apenas definido por sua ganância e por sua esposa (Penelope Cruz), a única coisa em sua vida que apresenta cores quentes. Fassbender continua a exibir aqui sua competência costumeira ao mostrar seu advogado como um tipo altamente confiante, cheio de ironia e sarcasmo mesmo quando todos ao seu redor alertam do perigo que seu investimento no tráfico representa e como essa casca de confiança vai aos poucos se partindo, inicialmente através de uma solitária lágrima em sua face, conforme as coisas começam a dar errado até o ponto em que ele se mostra completamente frágil e desesperado, debulhando-se em lágrimas e catarro. A iluminação ajuda a mostrar o arco descendente do sujeito e se inicialmente o vemos em casas e clubes espaçosos e repletos de luz, aos poucos ele começa a habitar espaços cada vez mais reduzidos e sombrios conforme a situação piora para ele.
O elenco de apoio é igualmente bem sucedido, mas o destaque fica mesmo por conta de Cameron Diaz que exibe aqui sua melhor performance em muito tempo. Sua Malkina é uma mulher fria, provocativa e manipuladora que não hesita em usar qualquer recurso à sua disposição para abalar aqueles à sua volta, incluindo, claro, o sexo, que ela fala e faz de um modo tão intenso e desdenhoso, deixando claro que aquilo não lhe dá nenhum prazer, sendo, aos seus olhos, apenas uma ferramenta como qualquer outra. A maquiagem dá ao rosto da personagem um aspecto felino, além do óbvio sinal que é sua tatuagem de guepardo, conferindo-lhe um semblante ao mesmo tempo sensual e perigoso que transmite sua natureza magnética e predadora.
Ao final, percebemos que todos os avisos ao advogado não foram em vão e aquele é um meio no qual a violência e a barbárie são tratadas como algo corriqueiro e apenas aqueles que buscam a própria sobrevivência podem sair vivos de algo tão irracional e brutal. O problema, na verdade, é que a direção sóbria e classicista de Ridley Scott parece não casar com o texto caótico e cínico de McCarthy e ficamos com a sensação de que o diretor meramente explora a tensão e o choque causados por esta violência aparentemente gratuita. Sob um olhar mais irônico e ácido como dos irmãos Coen, que já demonstraram afinidade com o texto do roteirista e romancista, é possível que este O Conselheiro do Crime conseguisse ir além.
Nota: 5/10

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