terça-feira, 27 de setembro de 2016

Crítica - O Lar das Crianças Peculiares

O Lar das Crianças Peculiares filme


Resenha O Lar das Crianças Peculiares
Já faz algum tempo que o diretor Tim Burton se reduziu a uma paródia de si mesmo. O razoável Grandes Olhos (2015) indicava que o diretor estava disposto a sair de sua zona de conforto e este O Lar das Crianças Peculiares trazia a impressão de que poderia ser seu retorno à boa forma. O resultado, no entanto, parece mais um piloto automático do diretor como Sombras da Noite (2012).

A trama acompanha Jake (Asa Butterfield), um garoto que cresceu ouvindo o avô (Terence Stamp) contando histórias sobre um fantástico orfanato no qual passou a infância e habitado por crianças com habilidades singulares. Durante boa parte da sua vida Jake achou que eram apenas histórias de ninar, mas quando seu avô é morto em circunstâncias estranhas, ele resolve investigar as histórias. Assim, ele acaba indo parar no orfanato dirigido por Miss Peregrine (Eva Green) que fica em um loop temporal que só pode ser acessado por "peculiares", pessoas com habilidades especiais que resolveram se isolar da humanidade com medo de serem perseguidas (pensem nos mutantes da franquia X-Men).

Tudo soa excessivamente similar a uma série de outras narrativas voltadas para o público jovem como Harry Potter, Percy Jackson ou Instrumentos Mortais, com um jovem que sempre se sentiu deslocado descobrindo que está no centro de uma disputa entre seres como poderes especiais e é levado a um local onde outros jovens como ele vivem e aprendem. A trajetória de Jake segue à risca o arquétipo da "jornada do herói", oferecendo um protagonista que não é nada além da repetição de fórmulas pré-prontas.

Isso ainda é prejudicado pelo ritmo da narrativa, cuja primeira metade é atolada por um excesso de diálogos expositivos que tentam esclarecer a lógica de loops temporais daquele universo, mas sem muito sucesso, fazendo toda a dinâmica de viagens no tempo parecer mais confusa e complicada do que precisaria ser. Além disso, parece não conseguir estabelecer um conflito claro até mais da metade da projeção. A sensação é que o filme cria esses personagens insólitos e esse universo fantástico e não sabe o que fazer com eles, demorando a decidir um caminho a seguir.

É possível ver a mão de Tim Burton no filme, mas tudo soa reciclado de filmes melhores do diretor. Temos a mensagem de abraçar a própria "esquisitice" e aceitar que de perto ninguém é normal. Temos o olhar sobre a vida típica de classe média, como algo enfadonho, ressaltado pelo uso da paleta de cores frias no "mundo real" contrastando com as cores vívidas do orfanato no loop temporal, algo similar ao que já tinha feito em A Noiva Cadáver (2005), Os Fantasmas se Divertem (1988) e alguns outros. Temos ainda uma figura paterna (o avô de Jake) cujas histórias fantásticas criam conflito com seu descendente tal qual em Peixe Grande e Suas Histórias Maravilhosas (2003). Sua predileção por animação em stop motion aparece em uma cena em que Enoch (Finlay MacMillan) dá vida a dois bonecos bizarros. Nada disso acrescentando ao que Burton já falou sobre esses tópicos em filmes anteriores.

Eva Green está ótima como a misteriosa Miss Peregrine, que transita entre a afabilidade e ferocidade, e o seu figurino reflete a sua forma de ave. Samuel L. Jackson consegue criar uma figura assustadora e divertida com seu Barron, ainda que não vá além do básico "vilão histérico megalômano", mas é prejudicado pela prótese que usa na boca para mostrar os dentes afiados de seu personagem. Tal qual aconteceu com Paula Patton em Warcraft: O Primeiro Encontro Entre Dois Mundos, Jackson parece estar sempre falando com a boca cheia de farofa e é incompressível (por se tratar de uma produção de grande orçamento) que ele não tenha redublado seus diálogos na pós-produção.

Visualmente consegue criar algumas imagens bem interessantes, principalmente quando explora as habilidades das crianças, em especial todo o embate ao clímax é bastante criativo. Os figurinos também ajudam a refletir o lado fantástico da obra, da já mencionada indumentária de Perigrine, passando aos sapatos de chumbo de Emma (Ella Purnell) à recriação fiel de roupas dos anos 40. É eficiente também em gerar algumas criaturas macabras que talvez assustem um público muito novo.

O problema é que a despeito de sua inventividade visual e personagens insólitos, O Lar das Crianças Peculiares soa como uma repetição rasteira de tudo que Tim Burton já fez antes, prejudicado também uma trama e personagens excessivamente formulaicos.


Nota: 5/10

Trailer:

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