segunda-feira, 28 de julho de 2025

Crítica – Amores Materialistas

 

Análise Crítica – Amores Materialistas

Review – Amores Materialistas
Em Amores Materialistas a diretora Celine Song tenta expandir algumas ideias sobre relacionamentos amorosos que trabalhou no excelente Vidas Passadas (2023). Lá ela desconstruía a ideia de que existe uma alma gêmea para cada pessoa, pensando que essa noção de pessoa ideal tem muito a ver com oportunidade e conveniência. Aqui em Amores Materialistas ela pondera sobre a natureza transacional dos relacionamentos.

Material girl

A narrativa gira em torno de Lucy (Dakota Jonhson), que trabalha numa agência de relacionamentos voltada para clientes de alta classe. Seu trabalho consiste em encontrar os pares ideais para seus clientes, homens e mulheres, que buscam alguém para casar. Em seu cotidiano ela pesa preferências de cada um, nível de renda e o que cada cliente exige de um par ideal. É um trabalho que pensa em relacionamentos quase como produtos, nos quais alguém busca um objeto com certas características e ela procura outra pessoa que se encaixe nas exigências e que cumpra as da outra pessoa. No casamento de uma cliente, Lucy conhece Harry (Pedro Pascal), um rico e charmoso investidor que reúne a beleza e dinheiro que ela espera de um par. Lucy também se reencontra com seu ex, John (Chris Evans), um ator de teatro cuja carreira nunca decolou e ainda vive de pequenos bicos mesmo próximo dos quarenta anos de idade. Apesar de não ter nada de material a oferecer, Lucy tem uma forte conexão afetiva com John e constantemente desabafa com ele.

A primeira cena do filme, com um homem das cavernas se aproximando de uma mulher levando flores e ferramentas feitas de osso e ela cede aos avanços do homem. É uma cena que ilustra como relacionamentos podem se construir a partir do interesse no que a outra pessoa tem a lhe oferecer, seja conforto material, status social que vem de riqueza ou aparência física, seja do prazer sexual que a outra pessoa lhe dá. Casamentos, afinal, são contratos e como qualquer contrato depende do interesse de ambas as partes. Esse componente materialista e até mesmo primitivo dos relacionamentos se verifica no presente nas reuniões que Lucy tem com os clientes nas quais homens e mulheres elencam o que buscam no parceiro, desde faixa de renda, passando por idade, altura ou medidas do corpo. Lucy encara tudo com um pragmatismo extremo, indagando aos clientes que elementos eles estariam dispostos a abrir mão na busca por um par e quais não são negociáveis, partindo da ideia de que nos relacionamos com alguém na medida em que percebemos que a outra pessoa nos agrega valor, mesmo que seja um valor sentimental, intangível.

Assim, ela é colocada em um triângulo amoroso no qual suas convicções serão testadas. De um lado Harry é tudo que sua mente materialista sempre desejou, ele atende a todos os seus critérios e ela os dele, já que ele é tão pragmático em sua visão de relacionamentos quanto ela. Por outro lado, John é alguém que está sempre presente, alguém que ela sabe que pode depender para suporte emocional e que consegue saber que Lucy não está bem pelas mínimas nuances de voz ou rosto. Johnson, Pascal e Evans formam um trio charmoso, com Evans e Pascal dotando seus personagens de uma medida de vulnerabilidade emocional que ajuda a dar aos dois personagens mais camadas. A dinâmica que o trio de atores estabelece entre si torna crível o dilema da protagonista mesmo quando o texto deixa pistas muito explícitas a respeito de quem ela irá escolher.

Relações abusivas

O principal problema do filme nem é a previsibilidade do triângulo amoroso, já que Evans e Pascal são pretendentes atraentes e carismáticos o bastante para manter nosso interesse, mas a maneira desajeitada com a qual a narrativa insere uma subtrama de abuso sexual envolvendo Sophie (Zoe Winters), uma das clientes de Lucy. A primeira coisa que chama atenção é o modo pouco crível pelo qual a situação é construída. Lógico, Lucy ou qualquer pessoa da empresa não tem como ter certeza total que os homens que participam do serviço não são agressores em potencial, mas considerando que é um serviço para pessoas de alta classe e os tempos em que estamos vivendo é difícil crer que a empresa de Lucy não possua qualquer protocolo para lidar com isso, como um botão de pânico ou um serviço de emergência.

Também incomoda que toda a trama de Sophie não discuta o abuso, a falta de punição para os homens que cometem isso ou outras variáveis sociais da questão. O abuso de sofrido pela personagem existe apenas para avançar a história de Lucy, já que a violência que Sophie passa e o confronto entre ela e Lucy lembram a protagonista dos perigos de tratar pessoas como objetos. O abuso de Sophie é um mero motivador para Lucy repensar suas convicções e as escolhas que faz em relação a John e Harry, lembrando que por mais transacional que um relacionamento seja, é difícil funcionar ou durar sem alguma medida de afeto.

O clímax é igualmente pouco crível, já que é difícil de acreditar que Sophie não tinham mais ninguém para ligar além de Lucy, mesmo tendo aberto um processo contra a empresa dela. Sim, ela pode ser uma pessoa tão focada na carreira que não tem amigas, mas se ela é essa figura bem sucedida ela provavelmente teria uma colega de trabalho, uma secretária, uma estagiária, alguém que pudesse chamar. Do jeito que está tudo soa forçado para fazer a redenção de Lucy, mesmo que o texto não a tenha feito merecer essa redenção.

Assim, a diretora Celine Song continua a trazer reflexões instigantes sobre a natureza dos relacionamentos, pensando em sua dimensão de transação a partir de um romance que se sustenta pelo charme de seu trio principal, já que a trama tropeça em algumas escolhas problemáticas.

 

Nota: 6/10


Trailer


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