O primeiro M3gan(2023)era um terror bastante tributário à franquia Brinquedo Assassino, embora atualizado
para a contemporaneidade, usando sua boneca cibernética para falar de
dependência tecnológica e como delegamos a criação de nossos filhos a
dispositivos digitais. Uma continuação poderia seguir fácil nesse caminho de
terror, mas M3gan 2.0 resolve
arriscar, mudando de terror para ação.
Rebelião das máquinas
A narrativa começa quando o
governo perde o controle de Amelia (Ivanna Sakhno), um robô de ataque criado a
partir de ideias semelhantes às de Megan. Gemma (Allison Williams) e Cady (Violet
McGraw) são identificadas como alvos potenciais de Amelia e passam a ser
vigiadas pelo governo, mas as autoridades logo se mostram incapazes de
protegê-las. É então que Gemma é contatada por Megan, cuja consciência ainda
existe em espaços digitais. Megan pede a Gemma que construa para ela um novo
corpo para que ela possa continuar cumprindo sua diretriz primária: tomar conta
de Cady. Sem escolha, Gemma cria um novo corpo para Megan enfrentar Amelia.
Talvez por eu ter visto ainda
garoto, mas Um Maluco no Golfe (1996)sempre me pareceu uma das comédias mais
legalzinhas do Adam Sandler. Com o tempo o comediante foi entregando produções
mais preguiçosas e que repetiam um tipo de humor que ficou datado. Fui para
este Um Maluco no Golfe 2 sem saber o
que esperar. Poderia ser um caminho de Sandler retornar a uma de suas melhores
comédias, no entanto, poderia ser também só mais uma repetição cansada visando
a nostalgia do espectador.
Bolas ao ar
A trama se passa décadas depois
do primeiro filme. Happy (Adam Sandler) perdeu a esposa, Virginia (Julie Bowen)
em um trágico acidente de golfe e abandonou o esporte. Agora ele cria seus
cinco filhos sozinhos, mas seus problemas com álcool o fazem perder a casa e se
atolar em dívidas. Quando sua filha caçula, Vienna (Sunny Sandler, filha de
Adam), passa na seleção para uma escola de balé na França, Happy decide voltar
ao golfe para pagar os estudos da filha.
Contando com a versão nunca
lançada oficialmente dirigida por Roger Corman, o Quarteto Fantástico já tinha
recebido quatro filmes sem que nenhum deles de fato acertasse o clima de
aventura da primeira família da Marvel. Só agora com este Quarteto Fantástico: Primeiros Passos que finalmente recebemos uma
produção que demonstra entender quem são esses personagens.
Família incrível
A trama se passa fora do universo
regular dos filmes da Marvel, em uma Terra na qual o Quarteto Fantástico são os
únicos heróis em atividade. Eles já atuam há anos e além de serem celebridades,
também tem uma ação filantrópica que transformou o mundo deles para melhor. Um
novo desafio se impõe a Reed (Pedro Pascal) e Sue (Vanessa Kirby) quando ela
descobre estar grávida. Com a ajuda de Johnny (Joseph Quinn) e Ben (Ebon Moss
Bachrach), Reed se prepara para a chegada do filho, mas o surgimento de uma
nova ameaça traz novas prioridades. A Surfista Prateada (Julia Garner) chega a
Terra avisando que em poucos meses o planeta será consumido por Galactus (Ralph
Ineson), o devorador de mundos.
Em Amores Materialistas a diretora Celine Song tenta expandir algumas
ideias sobre relacionamentos amorosos que trabalhou no excelente Vidas Passadas (2023). Lá ela
desconstruía a ideia de que existe uma alma gêmea para cada pessoa, pensando
que essa noção de pessoa ideal tem muito a ver com oportunidade e conveniência.
Aqui em Amores Materialistas ela
pondera sobre a natureza transacional dos relacionamentos.
Material girl
A narrativa gira em torno de Lucy
(Dakota Jonhson), que trabalha numa agência de relacionamentos voltada para
clientes de alta classe. Seu trabalho consiste em encontrar os pares ideais
para seus clientes, homens e mulheres, que buscam alguém para casar. Em seu cotidiano
ela pesa preferências de cada um, nível de renda e o que cada cliente exige de
um par ideal. É um trabalho que pensa em relacionamentos quase como produtos,
nos quais alguém busca um objeto com certas características e ela procura outra
pessoa que se encaixe nas exigências e que cumpra as da outra pessoa. No
casamento de uma cliente, Lucy conhece Harry (Pedro Pascal), um rico e charmoso
investidor que reúne a beleza e dinheiro que ela espera de um par. Lucy também se
reencontra com seu ex, John (Chris Evans), um ator de teatro cuja carreira
nunca decolou e ainda vive de pequenos bicos mesmo próximo dos quarenta anos de
idade. Apesar de não ter nada de material a oferecer, Lucy tem uma forte
conexão afetiva com John e constantemente desabafa com ele.
A primeira cena do filme, com um
homem das cavernas se aproximando de uma mulher levando flores e ferramentas
feitas de osso e ela cede aos avanços do homem. É uma cena que ilustra como
relacionamentos podem se construir a partir do interesse no que a outra pessoa
tem a lhe oferecer, seja conforto material, status social que vem de riqueza ou
aparência física, seja do prazer sexual que a outra pessoa lhe dá. Casamentos,
afinal, são contratos e como qualquer contrato depende do interesse de ambas as
partes. Esse componente materialista e até mesmo primitivo dos relacionamentos
se verifica no presente nas reuniões que Lucy tem com os clientes nas quais
homens e mulheres elencam o que buscam no parceiro, desde faixa de renda,
passando por idade, altura ou medidas do corpo. Lucy encara tudo com um
pragmatismo extremo, indagando aos clientes que elementos eles estariam
dispostos a abrir mão na busca por um par e quais não são negociáveis, partindo
da ideia de que nos relacionamos com alguém na medida em que percebemos que a
outra pessoa nos agrega valor, mesmo que seja um valor sentimental, intangível.
Assim, ela é colocada em um
triângulo amoroso no qual suas convicções serão testadas. De um lado Harry é
tudo que sua mente materialista sempre desejou, ele atende a todos os seus
critérios e ela os dele, já que ele é tão pragmático em sua visão de
relacionamentos quanto ela. Por outro lado, John é alguém que está sempre
presente, alguém que ela sabe que pode depender para suporte emocional e que
consegue saber que Lucy não está bem pelas mínimas nuances de voz ou rosto.
Johnson, Pascal e Evans formam um trio charmoso, com Evans e Pascal dotando
seus personagens de uma medida de vulnerabilidade emocional que ajuda a dar aos
dois personagens mais camadas. A dinâmica que o trio de atores estabelece entre
si torna crível o dilema da protagonista mesmo quando o texto deixa pistas
muito explícitas a respeito de quem ela irá escolher.
Relações abusivas
O principal problema do filme nem
é a previsibilidade do triângulo amoroso, já que Evans e Pascal são
pretendentes atraentes e carismáticos o bastante para manter nosso interesse,
mas a maneira desajeitada com a qual a narrativa insere uma subtrama de abuso
sexual envolvendo Sophie (Zoe Winters), uma das clientes de Lucy. A primeira
coisa que chama atenção é o modo pouco crível pelo qual a situação é
construída. Lógico, Lucy ou qualquer pessoa da empresa não tem como ter certeza
total que os homens que participam do serviço não são agressores em potencial,
mas considerando que é um serviço para pessoas de alta classe e os tempos em
que estamos vivendo é difícil crer que a empresa de Lucy não possua qualquer
protocolo para lidar com isso, como um botão de pânico ou um serviço de
emergência.
Também incomoda que toda a trama
de Sophie não discuta o abuso, a falta de punição para os homens que cometem
isso ou outras variáveis sociais da questão. O abuso de sofrido pela personagem
existe apenas para avançar a história de Lucy, já que a violência que Sophie
passa e o confronto entre ela e Lucy lembram a protagonista dos perigos de
tratar pessoas como objetos. O abuso de Sophie é um mero motivador para Lucy
repensar suas convicções e as escolhas que faz em relação a John e Harry,
lembrando que por mais transacional que um relacionamento seja, é difícil
funcionar ou durar sem alguma medida de afeto.
O clímax é igualmente pouco
crível, já que é difícil de acreditar que Sophie não tinham mais ninguém para
ligar além de Lucy, mesmo tendo aberto um processo contra a empresa dela. Sim,
ela pode ser uma pessoa tão focada na carreira que não tem amigas, mas se ela é
essa figura bem sucedida ela provavelmente teria uma colega de trabalho, uma
secretária, uma estagiária, alguém que pudesse chamar. Do jeito que está tudo
soa forçado para fazer a redenção de Lucy, mesmo que o texto não a tenha feito
merecer essa redenção.
Assim, a diretora Celine Song
continua a trazer reflexões instigantes sobre a natureza dos relacionamentos,
pensando em sua dimensão de transação a partir de um romance que se sustenta
pelo charme de seu trio principal, já que a trama tropeça em algumas escolhas
problemáticas.
O diretor Wes Anderson se tornou
famoso por seu estilo peculiar facilmente identificável e que a essa altura já
foi bastante parodiado. Em O Esquema
Fenício ele continua a exercitar seu jeito particular de conduzir tramas
permeadas por personagens excêntricos, mas dessa vez soa como uma repetição de
ideias que ele já fez antes.
Bilionário em fuga
A narrativa acompanha Zsa-zsa
Korda (Benício Del Toro), um excêntrico e ardiloso bilionário que desenvolveu
um esquema para enriquecer com um grande projeto de infraestrutura em um país
remoto. Seus planos, porém, o tornam alvo de governos ao redor do mundo que tem
interesses na região. Assim, Korda é constantemente alvo de tentativas de
assassinato. Temendo que seus inimigos o peguem, Korda entra em contato com
Liesl (Mia Threapleton, filha de Kate Winslet), sua filha mais velha de quem
está afastado há anos. Liesl quer ser freira, mas Korda a convence a viajar com
ele e ser a herdeira de seus empreendimentos caso ele sucumba aos ataques dos
inimigos. Dessa forma, os dois viajam pelo país remoto tentando convencer os
investidores de Korda a honrarem o esquema ao mesmo tempo em que tentam reparar
o relacionamento problemático entre eles.
Considerando que o quarto filme
do John Wick encerrou a história do personagem de maneira relativamente
definitiva, a única maneira de contar histórias sobre esse universo seria
através de outros personagens. É exatamente isso que Bailarina faz ao tentar expandir o mundo criado nos filmes do John
Wick com uma nova personagem.
Dança mortal
A narrativa se passa entre o
terceiro e o quarto filme do John Wick, tendo Eve (Ana de Armas) como
protagonista. Eve viu o pai ser morto na frente dela ainda pequena e depois
desse evento é acolhida pela Diretora (Angelica Houston) da Ruska Roma, o mesmo
clã mafioso no qual John Wick cresceu. Treinada desde jovem para ser uma
assassina, Eve começa a ascender nesse mundo de mercenários, mas logo reencontra
membros do grupo que matou seu pai e decide buscar vingança.
No papel The Alto Knights: Máfia e Poder soa como um filme promissor. A
história real de uma rivalidade entre dois grandes mafiosos estrelada por
Robert De Niro e dirigida pelo renomado Barry Levinson parece um filme com
tudo para dar certo. Infelizmente, no entanto, o que parece se conduzir como se
fosse um novo Os Bons Companheiros
(1990)termina mais próximo de um
desastre como Gotti: O Chefe da Máfia(2018).
Dupla explosiva
A narrativa se baseia na história
real da rivalidade entre Frank Costello (Robert De Niro) e Vito Genovese
(também Robert De Niro), dois imigrantes italianos que trabalharam juntos em
organizações mafiosas nos Estados Unidos da metade século XX e se tornaram
rivais disputando pelo controle. Suas personalidades são opostas, com Costello
sendo um sujeito mais suave, mais político, enquanto Vito é cabeça quente,
irascível e propenso a resolver tudo na base da violência. Quando um atentado à
vida de Frank fracassa, ele resolve se aposentar do comando da organização
passando tudo para Vito, mas a ambição e paranoia de Vito colocam tudo em
risco.
Comédia é inversão da ordem, é
subverter expectativas. Se você sabe exatamente o que vai acontecer em uma
piada ou situação cômica é difícil rir porque não houve essa quebra. A
previsibilidade sabota o humor. Isso é bem visível neste Família, Pero no Mucho estrelado por Leandro Hassum, que se apoia
em estereótipos manjados sobre argentinos para tentar fazer rir.
Entrando numa Fria
A trama é protagonizada por
Otávio (Leandro Hassum), cuja filha, Mariana (Julia Svaccina), está para
conseguir uma bolsa para estudar música na Europa, mas Otávio não aprova que a
filha vá para longe e a deixe sozinho cuidando do restaurante da família. Eles
brigam, mas ela vai mesmo assim. Anos depois, já formada, Mariana retorna e
traz consigo a novidade de que irá casar com um rapaz que conheceu na Europa. O
jovem, no entanto, não é europeu, mas argentino e Mariana organiza uma viagem
de sua família para Bariloche para conhecer a família do noivo. Logicamente
Otávio não aprova a união e isso causará muitas confusões.
Realizado por Orlando
Senna e Jorge Bodanzky e lançado em 1975 Iracema: Uma
Transa Amazônica chegou a ser proibido pela ditadura militar por muitos
anos e só foi lançado no Brasil em 1981. Hoje o filme recebe uma restauração em
4K para voltar aos cinemas e revisitá-lo agora traz a constatação melancólica
de que muito pouco mudou no país entre os cinquenta anos que separam
sua produção do seu retorno às salas de cinema.
Mitos desconstruídos
A narrativa acompanha o
caminhoneiro Tião Brasil Grande (Paulo César Peréio) que vai para o norte do
Brasil por conta da promessa de progresso e riqueza que a rodovia
Transamazônica (oficialmente a BR-230) supostamente traria. Chegando lá ele
conhece Iracema (Edna de Cássia), uma adolescente indígena que sobrevive de
prostituição, e a leva consigo em suas viagens pelo norte. É um filme que
mistura atores e cenas encenadas com personagens reais, colocando Peréio para
interagir com pessoas da região enquanto dialoga sobre o suposto progresso que
o governo militar diz estar acontecendo por conta da obra da rodovia.
Em Democracia em Vertigem (2019) a diretora Petra Costa narra a queda
de Dilma Roussef da presidência com grande vigor arquivístico, mas que se
acomodava em fazer de sua narrativa uma grande bricolagem de vários momentos
chave que foram narrados continuamente no noticiário político brasileiro sem
oferecer muito em termos de uma nova perspectiva ou de uma grande sacada
interpretativa que contribuísse para uma compreensão mais aprofundada dos fatos.
Neste Apocalipse nos Trópicos a
diretora se propõe a fazer um mergulho no ambiente da direita conservadora,
principalmente àquela ligada a igrejas neopentecostais, para melhor entender a ascensão
desse grupo na política brasileira.
Repetição histórica
Digo que o filme propõe esse mergulho
porque ele fica na proposta apenas. A ideia de um debate para tentar
compreender a ascensão da direita evangélica e sua adesão ao bolsonarismo é
logo abandonada para que a diretora basicamente repita os mesmos procedimentos
de Democracia em Vertigem, um
apanhado de imagens de arquivo e outras registradas pela diretora que recapitulam
momentos chave da vida política brasileira que tiveram bastante exposição midiática
nos últimos anos, tudo embalado por uma narração sussurrante, lamuriosa que fala
através de platitudes que explicitam o óbvio das imagens.